PARTICIPATORY DEMOCRACY: ANALYSIS OF THE PARTNERSHIP BETWEEN THE STATE OF BAHIA AND CIVIL SOCIETY ORGANIZATIONS IN LIGHT OF FEDERAL LAW No. 13.019/2014 AND STATE DECREE No. 17.091/2016
Informações Básicas
Revista Qualyacademics v.2, n.4
ISSN: 2965-9760
Tipo de Licença: Creative Commons, com atribuição e direitos não comerciais (BY, NC).
Recebido em: 05/07/2024
Aceito em: 05/07/2024
Revisado em: 08/07/2024
Processado em: 08/07/2024
Publicado em 08/07/2024
Categoria: Artigo de revisão
Como referenciar esse artigo Souza (2024):
SOUZA, Maristela Palmeira de Barros. Democracia participativa: análise da parceria entre o estado da Bahia e as Organizações da Sociedade Civil, à luz da Lei Federal n.° 13.019/2014 e do Decreto Estadual n.º 17.091/2016. Revista QUALYACADEMICS. Editora UNISV; v. 2, n. 4, 2024; p. 05-21. ISSN: 2965-9760 | DOI: doi.org/10.59283/unisv.v2n4.001
Autora:
Maristela Palmeira de Barros Souza
Maristela Palmeira de Barros Souza, Advogada, Pós-Graduada, pela: Escola de Magistrados da Bahia – EMAB – Universidade Federal da Bahia – UFBA, Pós em Direito e Magistratura. Pós-Graduada, pela: Universidade Salvador – UNIFACS – Especialização em Direito Contratual Cível e Consumerista. Graduada em Direito, pela Universidade Católica do Salvador – UCSAL. E-mail: maristelabarros.juridico@gmail.com.
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RESUMO
Este artigo apresenta uma pesquisa bibliográfica e documental sobre a averiguação da eficácia da democracia participativa na cooperação entre o Estado da Bahia e as Organizações da Sociedade Civil (OSC). O escopo do estudo envolve a análise das disposições legais e regulamentares que fundamentam essas parcerias, com destaque para o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC) e o pioneirismo da Bahia na criação do Conselho Estadual de Fomento e Colaboração (CONFOCO). Justifica-se pelo avanço que o MROSC representou na formulação e implementação de programas de governo, ao incorporar princípios de gestão participativa e controle social. A metodologia aplicada combina revisão bibliográfica e análise documental de legislação e artigos acadêmicos, visando proporcionar uma visão abrangente e crítica sobre os mecanismos de cooperação previstos. Os principais resultados indicam que a Bahia, ao regulamentar o MROSC por meio do Decreto n.º 17.091/2016, promoveu um ambiente de maior transparência, monitoramento e avaliação das políticas públicas, permitindo uma gestão mais inclusiva e democrática dos recursos públicos. Esse modelo reforça a ideia de que a participação da sociedade civil nas decisões governamentais pode conduzir a uma distribuição mais justa e eficiente dos recursos, atendendo aos interesses das camadas mais vulneráveis da população. Conclui-se que a adoção de práticas participativas fortalece a democracia e legitima as ações do poder público, assegurando uma governança mais equitativa e responsiva às necessidades sociais.
Palavras-chave: Democracia Participativa; Organizações da Sociedade Civil; Mútua Cooperação; Tomada de Decisão; Controle dos Atos do Poder Público; Gestão Democrática de Recursos Públicos.
ABSTRACT
This article presents a bibliographic and documentary research on the investigation of the effectiveness of participatory democracy in the cooperation between the State of Bahia and Civil Society Organizations (CSOs). The scope of the study involves analyzing the legal and regulatory provisions that underpin these partnerships, highlighting the Civil Society Regulatory Framework (MROSC) and Bahia's pioneering role in creating the State Council for Development and Collaboration (CONFOCO). This is justified by the progress that MROSC represented in the formulation and implementation of government programs, by incorporating principles of participatory management and social control. The applied methodology combines bibliographic review and documentary analysis of legislation and academic articles, aiming to provide a comprehensive and critical view of the proposed cooperation mechanisms. The main results indicate that Bahia, by regulating MROSC through Decree No. 17.091/2016, promoted an environment of greater transparency, monitoring, and evaluation of public policies, allowing for a more inclusive and democratic management of public resources. This model reinforces the idea that civil society's participation in government decisions can lead to a fairer and more efficient distribution of resources, addressing the interests of the most vulnerable segments of the population. It is concluded that the adoption of participatory practices strengthens democracy and legitimizes public actions, ensuring more equitable and responsive governance to social needs.
Keywords: Participatory Democracy; Civil Society Organizations; Cooperation; Decision Making; Control of Public Power Acts; Democratic Management of Public Resources.
1. INTRODUÇÃO
A democracia participativa, caracterizada pela inclusão direta da sociedade civil nos processos decisórios do governo, tem ganhado destaque como um modelo eficaz de gestão pública. A Lei Federal n.º 13.019/2014, conhecida como o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC), e o Decreto Estadual n.º 17.091/2016 do Estado da Bahia, são exemplos claros desse avanço. Esses dispositivos legais visam fortalecer a cooperação entre o governo e as Organizações da Sociedade Civil (OSC), promovendo uma gestão pública mais inclusiva, transparente e democrática.
Sendo assim, o estudo surge da questão central: por que a tomada de decisão dos atos da Administração Pública deve ser controlada pela sociedade civil por meio de parcerias com organizações previstas na referida lei e regulamento? A hipótese investigativa reside na premissa de que o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC) representou um avanço significativo na gestão dos recursos coletivos, refletindo os princípios da democracia participativa ao permitir que os programas políticos atendam também às demandas das camadas mais vulneráveis da população, representadas pelas OSCs.
O MROSC representou um marco significativo na forma como as parcerias entre o poder público e as OSCs são estabelecidas, regulamentadas e monitoradas. Segundo Avritzer (2017), "a participação direta da sociedade civil nas decisões governamentais é crucial para a promoção de uma gestão pública mais transparente e democrática". Essa legislação trouxe mecanismos que permitem uma maior participação popular na formulação e execução de políticas públicas, garantindo que os recursos destinados à coletividade sejam aplicados de forma mais equitativa e eficiente.
No contexto baiano, a implementação do Decreto n.º 17.091/2016 evidenciou o compromisso do Estado em adotar práticas de gestão participativa. A criação do Conselho Estadual de Fomento e Colaboração (CONFOCO) exemplifica essa iniciativa pioneira, proporcionando um espaço institucionalizado para o acompanhamento, monitoramento e avaliação das políticas públicas voltadas às OSCs. Conforme destaca Santos (2016), "a democracia participativa proporciona um ambiente em que as políticas públicas são moldadas pelas reais necessidades da população, promovendo equidade e justiça social".
A relevância deste estudo se justifica pela necessidade de compreender como esses instrumentos legais têm contribuído para a efetivação da democracia participativa no Estado da Bahia. A problemática central questiona por que a tomada de decisão dos atos da Administração Pública deve ser controlada pela sociedade civil, por meio de parcerias com as OSCs previstas na Lei n.º 13.019/2014 e regulamentadas pelo Decreto Estadual n.º 17.091/2016. A hipótese investigativa reside na premissa de que o MROSC e a regulamentação estadual correspondente possibilitam uma gestão mais democrática dos recursos públicos, ao incluir ativamente a sociedade civil no processo decisório.
O objetivo geral deste estudo é demonstrar a importância da gestão pública inclusiva no contexto da democracia participativa. Especificamente, busca-se analisar a mútua colaboração estabelecida pelo MROSC, destacando a igualdade participativa na formulação e implementação de políticas públicas. A metodologia adotada consiste em uma revisão bibliográfica e análise documental de legislações e artigos acadêmicos, proporcionando uma visão abrangente e crítica dos mecanismos de cooperação previstos.
Ao abordar a eficácia da democracia participativa na cooperação entre o Estado da Bahia e as OSCs, este estudo pretende contribuir para o entendimento das dinâmicas de participação e controle social na gestão pública. A adoção de práticas participativas fortalece a democracia e legitima as ações do poder público, assegurando uma governança mais equitativa e responsiva às necessidades sociais.
2. CONTEXTO HISTÓRICO DO MARCO REGULATÓRIO DAS ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL
A administração pública gerencial permitiu que os serviços e atividades de responsabilidade do Estado fossem prestados por entidades sem fins lucrativos, contempladas no chamado “terceiro setor”. Este setor, composto por organizações privadas que atuam em benefício da coletividade, contrasta com os outros dois setores tradicionais: o primeiro setor, que compreende a administração direta e indireta do Estado, responsável pelo atendimento dos interesses coletivos, e o segundo setor, constituído pela iniciativa privada, voltada para fins lucrativos.
O terceiro setor, apesar de não fazer parte do Estado, é entendido como de necessidade pública devido ao seu papel no desenvolvimento de atividades sociais. Sua regulamentação foi estabelecida por diversas leis, incluindo as Leis n.º 9.637/1998, n.º 9.790/1999 e n.º 13.019/2014, cada uma especificando diferentes tipos de organizações, como as Organizações Sociais (OS), as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) e as Organizações da Sociedade Civil (OSC).
As Organizações Sociais (OS) são entidades de direito privado que executam serviços não exclusivos do Estado e são fiscalizadas pelo Tribunal de Contas. Para se qualificarem como OS, essas entidades precisam preencher requisitos específicos e comprovar três anos de funcionamento. A qualificação é decidida pelo ministério relacionado à área de atuação da entidade, podendo esta atuar em setores como ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, proteção ambiental, cultura e saúde. A decisão de qualificação é discricionária, baseada em critérios de conveniência e oportunidade, e formalizada por meio de um contrato de gestão.
As Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), por sua vez, são pessoas jurídicas de direito privado e sem fins lucrativos que desempenham serviços sociais não exclusivos do Estado, beneficiando-se de incentivos. Diferentemente das OS, a qualificação das OSCIP é um ato vinculado e sua fiscalização é realizada pelo órgão público correspondente à área de atuação da entidade, além dos Conselhos de Políticas Públicas. As áreas de atuação das OSCIP incluem a promoção de assistência social, cultura, defesa do patrimônio histórico e artístico, educação gratuita, saúde complementar, segurança alimentar e nutricional, entre outras. O termo de parceria é o instrumento que formaliza a colaboração entre a OSCIP e o poder público.
No entanto, algumas entidades não podem ser qualificadas como OSCIP, como sociedades comerciais, sindicatos, associações de classe, instituições religiosas, organizações partidárias, entidades de benefício mútuo, empresas que comercializam planos de saúde, instituições hospitalares privadas não gratuitas, escolas privadas não gratuitas, Organizações Sociais (OS), cooperativas e fundações públicas. Esta exclusão visa garantir que os incentivos e benefícios associados à qualificação como OSCIP sejam destinados exclusivamente a entidades cuja missão seja o interesse público e o desenvolvimento social, sem fins lucrativos.
A regulamentação dessas entidades reflete a necessidade de uma colaboração eficaz entre o Estado e a sociedade civil, promovendo uma gestão pública mais participativa e democrática. A inserção do terceiro setor na prestação de serviços públicos permite que as políticas governamentais sejam mais alinhadas com as necessidades reais da população, promovendo a inclusão social e a justiça distributiva. Essa parceria fortalece a democracia participativa ao assegurar que as decisões sobre a alocação de recursos públicos sejam influenciadas por aqueles diretamente afetados por essas políticas.
As Organizações da Sociedade Civil – OSC, segundo o que preleciona o art. 2º, inc. I, “a”, “b” e “c”, da Lei n.º 13.019, são (BRASIL, 2014):
a) entidade privada sem fins lucrativos que não distribua entre os seus sócios ou associados, conselheiros, diretores, empregados, doadores ou terceiros eventuais resultados, sobras, excedentes operacionais, brutos ou líquidos, dividendos, isenções de qualquer natureza, participações ou parcelas do seu patrimônio, auferidos mediante o exercício de suas atividades, e que os aplique integralmente na consecução do respectivo objeto social, de forma imediata ou por meio da constituição de fundo patrimonial ou fundo de reserva; (Incluído pela Lei nº 13.204, de 2015)
b) as sociedades cooperativas previstas na Lei nº 9.867, de 10 de novembro de 1999 ; as integradas por pessoas em situação de risco ou vulnerabilidade pessoal ou social; as alcançadas por programas e ações de combate à pobreza e de geração de trabalho e renda; as voltadas para fomento, educação e capacitação de trabalhadores rurais ou capacitação de agentes de assistência técnica e extensão rural; e as capacitadas para execução de atividades ou de projetos de interesse público e de cunho social. (Incluído pela Lei nº 13.204, de 2015)
c) as organizações religiosas que se dediquem a atividades ou a projetos de interesse público e de cunho social distintas das destinadas a fins exclusivamente religiosos; (Incluído pela Lei nº 13.204, de 2015).
Após a implementação do Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC), estabeleceu-se um novo patamar de reconhecimento e regulamentação para as Organizações Não Governamentais (ONGs), que passaram a ser enquadradas como Organizações da Sociedade Civil (OSC). Essa mudança excluiu apenas as OSCIP (Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público) e as OS (Organizações Sociais), que podem ser reconhecidas como ONGs, mas possuem regulamentações específicas. É importante notar que enquanto toda OSCIP é considerada uma ONG ou uma OSC, nem toda ONG ou OSC é classificada como OSCIP.
Historicamente, as OSC enfrentaram significativas barreiras regulatórias, com um arcabouço jurídico que não atendia adequadamente às suas necessidades e peculiaridades. Durante muitos anos, o Brasil careceu de uma regulamentação que compreendesse plenamente a cooperação entre o Estado e a sociedade civil, resultando em uma aplicação desigual das regras existentes e limitando o potencial das parcerias.
Para preencher esse vácuo legislativo, foi instituído um grupo de trabalho com o objetivo de desenvolver uma legislação que atendesse às especificidades das OSC. Este esforço culminou na publicação do MROSC no Diário Oficial da União em 1º de agosto de 2014. De acordo com Lopes et al. (2016), a Lei n.º 13.019/2014 representou uma significativa conquista para a sociedade brasileira. Com sua entrada em vigor em 23 de janeiro de 2016 para a União, Estados e Distrito Federal, e em 1º de janeiro de 2017 para os Municípios, foi estabelecido um novo regime jurídico para as parcerias entre a administração pública e as OSCs. Este regime introduziu instrumentos jurídicos específicos, como os Termos de Fomento e de Colaboração, para parcerias com recursos financeiros, e o Acordo de Cooperação, para aquelas sem recursos financeiros.
A implementação do MROSC teve um impacto profundo nas relações entre o poder público e as OSCs em todo o país. Este novo marco legal não apenas incentivou a gestão pública democrática em diversas esferas de governo, mas também valorizou as OSCs como parceiras essenciais na garantia e efetivação de direitos. As parcerias fortalecidas entre o Estado e as OSCs qualificaram as políticas públicas, aproximando-as das realidades locais e possibilitando a solução de problemas sociais de maneira criativa e inovadora.
Segundo Lopes et al. (2016) a Lei n.º 13.019/2014 foi uma conquista da sociedade:
Com sua entrada em vigor em 23 de janeiro de 2016 na União, Estados e Distrito Federal, e nos Municípios em 1º de janeiro de 2017, passa a ser estabelecido um novo regime jurídico das parcerias entre a administração pública e as organizações por meio de novos instrumentos jurídicos: os termos de Fomento e de Colaboração, no caso de parcerias com recursos financeiros, e o Acordo de Cooperação, no caso de parcerias sem recursos financeiros.
A nova lei vai impactar as relações entre poder público e OSCs em todo o País. A sua implementação estimula a gestão pública democrática nas diferentes esferas de governo e valoriza as organizações da sociedade civil como parceiras do Estado na garantia e efetivação de direitos.
As parcerias entre o Estado e as organizações da sociedade civil qualificam as políticas públicas, aproximando-as das pessoas e das realidades locais e possibilitando a solução de problemas sociais específicos de forma criativa e inovadora.
Com a nova lei, as OSCs podem ampliar suas capacidades de atuação e incorporar muitas de suas pautas à agenda pública. Além disso, as parcerias com o poder público estão agora amparadas em regras claras e válidas em todo o País, com foco no controle de resultados das parcerias.
Com um marco legal próprio e práticas institucionais que valorizem as OSCs, é possível responder adequadamente às necessidades de uma sociedade civil atuante, que se expandiu e diversificou nas últimas décadas e que tem muito a contribuir com a democracia brasileira.
Assim, entende-se que a nova legislação permitiu que as OSCs ampliassem suas capacidades de atuação e incorporassem muitas de suas pautas à agenda pública. As parcerias com o poder público, agora respaldadas por regras claras e uniformes em todo o país, enfocam o controle de resultados e a transparência. Com um marco legal próprio e práticas institucionais que valorizam as OSCs, torna-se possível atender adequadamente às necessidades de uma sociedade civil ativa e diversificada, que se expandiu nas últimas décadas e que desempenha um papel crucial na consolidação da democracia brasileira.
As lições trazidas pela Escola Nacional de Adminsitração Pública (ENAP, 2019) mostram, que:
A principal motivação do novo regime jurídico de parcerias está orientada pelo fato de que a incidência, o impacto e a riqueza das organizações da sociedade civil na execução de políticas públicas precisam ser acompanhados de um quadro normativo que reconheça e valorize o trabalho das organizações à altura dos desafios da democracia brasileira.
Ou seja, o ENAP atesta que a principal motivação para o novo regime jurídico de parcerias é o reconhecimento da importância e do impacto das OSCs na execução de políticas públicas. Este reconhecimento exige um quadro normativo que valorize o trabalho dessas organizações, de modo a enfrentar os desafios contemporâneos da democracia no Brasil. O novo regime não só promove a transparência e a accountability na aplicação dos recursos públicos, mas também incentiva a inovação nas tecnologias sociais e a efetividade na execução dos projetos, garantindo assim a plena participação da sociedade civil nos processos decisórios.
Essa evolução legislativa e institucional destaca a importância de um ambiente favorável que estimule o potencial da sociedade civil organizada, promovendo uma maior inclusão, justiça social e governança democrática. O MROSC fortalece a democracia participativa ao assegurar que as decisões sobre a alocação de recursos públicos sejam influenciadas por aqueles diretamente afetados por essas políticas, promovendo uma gestão pública mais responsiva e equitativa.
Torna-se fundamental a criação de um ambiente mais favorável que estimule o potencial da sociedade civil organizada, assegurando plena participação, transparência na aplicação dos recursos públicos, efetividade na execução dos projetos e inovação das tecnologias sociais. Este contexto é crucial para fortalecer a democracia participativa, permitindo que as Organizações da Sociedade Civil (OSC) desempenhem um papel ativo e eficiente na formulação e implementação de políticas públicas. A transparência e a accountability são pilares essenciais para garantir que os recursos públicos sejam utilizados de maneira justa e eficiente, enquanto a inovação nas tecnologias sociais promove soluções criativas e eficazes para os desafios sociais contemporâneos. Dessa forma, um ambiente favorável não apenas valoriza o trabalho das OSCs, mas também potencializa sua capacidade de contribuir significativamente para a governança democrática e para o desenvolvimento sustentável da sociedade.
3. TIPOS JURÍDICOS DE OSC NA LEI N.º 13.019/2014
A determinação das entidades privadas que podem ser consideradas como OSC está inserta no teor da Lei do MROSC (BRASIL, 2014), segundo se nota no art. 2º, caput, inc. I, “a”, “b” e “c”:
Art. 2º Para os fins desta Lei, considera-se:
I - organização da sociedade civil: (Redação dada pela Lei nº 13.204, de 2015)
a) entidade privada sem fins lucrativos que não distribua entre os seus sócios ou associados, conselheiros, diretores, empregados, doadores ou terceiros eventuais resultados, sobras, excedentes operacionais, brutos ou líquidos, dividendos, isenções de qualquer natureza, participações ou parcelas do seu patrimônio, auferidos mediante o exercício de suas atividades, e que os aplique integralmente na consecução do respectivo objeto social, de forma imediata ou por meio da constituição de fundo patrimonial ou fundo de reserva; (Incluído pela Lei nº 13.204, de 2015)
b) as sociedades cooperativas previstas na Lei nº 9.867, de 10 de novembro de 1999 ; as integradas por pessoas em situação de risco ou vulnerabilidade pessoal ou social; as alcançadas por programas e ações de combate à pobreza e de geração de trabalho e renda; as voltadas para fomento, educação e capacitação de trabalhadores rurais ou capacitação de agentes de assistência técnica e extensão rural; e as capacitadas para execução de atividades ou de projetos de interesse público e de cunho social. (Incluído pela Lei nº 13.204, de 2015)
c) as organizações religiosas que se dediquem a atividades ou a projetos de interesse público e de cunho social distintas das destinadas a fins exclusivamente religiosos; (Incluído pela Lei nº 13.204, de 2015).
Dessarte, se percebe que essas entidades correspondem a grupos formados pela própria sociedade em busca do desenvolvimento de interesses públicos.
Brasília Ambiental (2019) define que as parcerias firmadas entre o Poder Público e as OSC supracitadas “qualificam as políticas públicas, aproximando-as das pessoas e das realidades locais e possibilitando a solução de problemas sociais específicos de forma criativa e inovadora”.
Outrossim, a Receita Federal (2022) anuncia que essas pessoas jurídicas:
Objetivam cooperar com o Estado no atendimento ao interesse público, visando produzir transformações mediante a promoção de direitos sociais, conscientização socioambiental e combate à exclusão social, sobretudo no atendimento às pessoas em situação de vulnerabilidade (os mais frágeis da sociedade).
4. INSTRUMENTOS DE MÚTUA COOPERAÇÃO
As Organizações da Sociedade Civil conquistaram grandes espaços nas discussões das políticas públicas, em razão de se encontrarem mais próximas das camadas menos favorecidas da sociedade. Possibilitando, desse modo, maior justiça na distribuição de recursos públicos.
Por esse motivo, se identificou que os instrumentos jurídicos de celebração de parcerias com o terceiro setor, disponíveis na legislação existente, não atendiam às especificidades dessas Organizações não Governamentais.
Após a consolidação dos clamores da sociedade, por meio da Lei do MROSC, foram criados, como mecanismos de celebração de mútua colaboração os instrumento, de: Termo de Colaboração, Termo de Fomento e Acordo de Cooperação.
Por Termo de Colaboração se entende que é o instrumento da parceria proposto pela Administração Pública, no qual há previsão de repasse de recursos públicos. Geralmente, é celebrado após processo de seleção de Chamamento Público.
O Termo de Fomento, por sua vez, é proposto pelas Organizações da Sociedade Civil, com repasse de recursos financeiros. Sendo, por regra, também celebrado por meio de Chamamento Público.
O Acordo de cooperação pode ser proposto tanto pela Administração Pública quanto pelas entidades representativas da sociedade e não envolve repasses financeiros.
5. REGULAMENTAÇÃO DAS PARCERIAS NO ESTADO DA BAHIA
Após diversos debates em plenário, criou-se a Lei do MROSC, que estabeleceu a contratualização do regime de parcerias por ela designado, tendo por principal objetivo fornecer segurança jurídica às variadas situações reclamadas pela sociedade civil organizada.
À semelhança de discussões no cenário nacional, o Estado da Bahia regulamentou a Lei Federal após processo de participação popular, por meio grupo de trabalho paritário.
Isso culminou na edição do Decreto Estadual n.º 17.091/2016, o qual definiu regras à celebração de parcerias e prestigiou a oferta de serviço públicos, pelas OSC, à população específica.
A aludida norma regulamentadora estadual representou, desse modo, a gestão participativa, pelos grupos societários.
Na colocação da Procuradoria Geral do Estado da Bahia (2016), significou um avanço democrático.
A nomeada Procuradoria Jurídica, ainda, afiança, que:
O texto do decreto foi construído pelo Grupo de Trabalho do Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (GT MROSC – BA), composto, de forma paritária, por representantes do poder público e das OSC, instituído por decreto estadual, homologado pelo governador Rui Costa e coordenado pela Secretaria de Relações Institucionais (Serin).
Participaram do GT, representando a Procuradoria Geral do Estado, as procuradoras Ivana Pirajá e Juliana Lima Damasceno.
Determina-se que “o processo de trabalho contou com estratégias de ampliação da participação popular por meio de seminários, videoconferências e consulta pública online”.
O seu raciocínio consagrou que as convergências de esforços foram “direcionadas pelas experiências, conhecimentos e situações vivenciadas tanto pela OSC quanto pelo Poder Público.”
6. O PAPEL DO CONSELHO ESTADUAL DE FOMENTO E COLABORAÇÃO – CONFOCO-BA
Com base nos princípios de controle social e participação, o Conselho Estadual de Fomento e Colaboração (Confoco-BA) foi instituído pelo Decreto Estadual n.º 17.091/2016. Reconhecido como o primeiro conselho desse tipo constituído no Brasil, o Confoco-BA atua na gestão participativa dos recursos públicos, desempenhando funções essenciais como acompanhamento, monitoramento e avaliação de políticas públicas decorrentes de parcerias de mútua cooperação.
Além disso, o conselho é responsável pela emissão de pareceres e proposições sobre normativos complementares ao decreto, bem como pela disseminação do regime de parcerias adotado pela Lei do MROSC e seu decreto regulamentador. Essas atividades reforçam a transparência e a eficácia das políticas públicas, promovendo uma governança mais democrática e inclusiva.
7. DEMOCRACIA PARTICIPATIVA
A democracia se trata de uma forma de governo exercida pelo povo, pelas eleições e participações cidadãs. Nela, os cidadãos partilham, direta ou indiretamente, dos direitos políticos de dada sociedade.
Por democracia direta se compreende que corresponde à modalidade na qual os cidadãos interferem diretamente nas decisões políticas, fomentando discussões e fornecendo votos.
Por outro viés, a democracia indireta demanda que os cidadãos, por intermédio dos votos, elejam seus representantes, que prestam compromisso de bem escolher as melhores condições ao atendimento dos anseios da coletividade que os elegeu.
No Brasil, coexistem os dois tipos de democracia. Pelo que, se considera que, no País, há, em verdade, uma democracia semidireta.
Notam-se na democracia semidireta a representatividade do povo, por aqueles eleitos para tomada de decisões políticas e a possibilidade de os cidadãos diretamente influenciarem as decisões políticas, por meio de plebiscito, referendo e iniciativa popular, conforme rezam os arts. 1º, parágrafo único e 14, incisos I, II e III, da Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, 1988) :
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:
I - plebiscito;
II - referendo;
III - iniciativa popular.
Todavia, diante do cenário de corrupção do poder político no Brasil, se analisou, como viável, uma democracia participativa.
Dessa maneira, o exercício do poder, pelo povo, não se dá, apenas, por intermédio do voto para sua representatividade ou mediante interferências diretas encontradas no citado art. 14, da CF/1988, as quais assumem feições do modelo democracia participativa clássico.
No modelo mais moderno de democracia participativa, também chamada de deliberativa, se encontram as ideias de formação de decisões políticas, de modo a gerir o rateio de recursos públicos à camada social mais necessitada. Apontando um maior controle social dos atos da Administração Pública.
Isso decorre do fato de que há clamores exclusivos de parte da sociedade civil que só podem ser reparados a partir de sua interação com o Poder Público.
Entende-se que em uma democracia participativa, sem renunciar a representatividade das eleições constitucionalmente prevista, a população, mais diretamente, passa ter um contato permanente com o parlamento de modo a exercer influência nas decisões que lhes atingem.
Segundo Araújo (2021), a democracia participativa:
vislumbra da formação de uma teoria constitucional que nos aparta dos modelos representativos clássicos.
Pertence à democracia participativa e faz do cidadão-povo a medula da legitimidade de todo o sistema. Acaba-se então a intermediação representativa, símbolo de tutela, sujeição e menoridade democrática do cidadão–meio povo, meio súdito. (apud BONAVIDES, 2001, p.35)
Araújo defende que esse tipo de legitimidade democrática está inserido na nova hermenêutica constitucional, que se fundamenta em "elementos valorativos, cuja supremacia nos faz chegar à democracia participativa". Em suas palavras, a democracia deliberativa ou participativa é uma "democracia da concretude e da realidade e não do sonho ou da utopia; democracia do povo e não da representação" (apud Bonavides, 2001, p. 38). Assim, ele compreende que uma das principais virtudes da democracia participativa é o seu auxílio na representação política, permitindo que os cidadãos, além de escolherem seus governantes, decidam como desejam ser governados (apud Duarte Júnior, 2014, p. 237).
Gaspardo (2018) aponta que o modelo de democracia participativa facilita a inclusão de populações historicamente excluídas das decisões políticas, criando um caráter deliberativo de participação, fomentando o papel pedagógico da participação e promovendo a pluralidade de desenhos institucionais. Ele preleciona que a democracia participativa reivindica espaços participativos ampliados para atores sociais política, social e economicamente mais fracos, que são geralmente excluídos dos processos decisórios (apud Campnell et al., 2009, p. 5-7; Avritzer, 2007).
Gaspardo argumenta ainda que o caráter deliberativo da participação envolve um processo de aprendizagem onde as preferências podem ser alteradas com base nos argumentos apresentados no debate público (apud Campnell et al., 2009, p. 5-7). No que tange ao papel pedagógico, ele avalia que o processo participativo ajuda a desenvolver uma "ação responsável, individual, social e política e qualifica o cidadão para participar das questões coletivas e incrementa sua capacidade de julgamento" (apud Pateman, 1992, p. 35-63). Por fim, Gaspardo aponta que em uma democracia deliberativa, as "diferentes experiências de inovação institucional que, em geral, não resultam de formulações acadêmicas ou de tecnocratas, mas são forjadas pela sociedade civil e pela luta política".
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS
É indubitável que a tomada de decisão dos atos da Administração Pública deve ser controlada pela sociedade civil, o que justifica a adoção do modelo de democracia participativa no Brasil. Esse modelo é evidenciado nas parcerias com as Organizações da Sociedade Civil (OSC), previstas nacionalmente pela Lei n.º 13.019/2014 e regulamentadas no Estado da Bahia pelo Decreto Estadual n.º 17.091/2016. As OSCs desempenham um papel crucial ao promover a inclusão da população nas discussões e decisões sobre as atuações da Administração Pública, permitindo uma maior participação dos atores sociais anteriormente marginalizados na gestão política dos recursos públicos.
O Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC) representa uma agenda política ampla, destinada a aperfeiçoar os programas de governo ou de estado com a intervenção das entidades representativas da coletividade. Esse marco demonstra claramente a possibilidade de os cidadãos interferirem diretamente nas decisões do Poder Público, reforçando a transparência e a responsabilidade na gestão pública.
A Secretaria-Geral da Presidência da República destaca que o MROSC teve como objetivo central o "aperfeiçoamento do ambiente jurídico, institucional, político e sociocultural das OSC e de suas relações de parceria com o Estado". No plano federal, a Lei n.º 13.019/2014 concretizou o MROSC e estabeleceu o regime jurídico das parcerias entre a Administração Pública e as OSCs, baseado na mútua cooperação para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco.
No âmbito estadual, a regulamentação do MROSC pelo Decreto Estadual n.º 17.091/2016 representou um significativo avanço na democracia participativa. Esta regulamentação promoveu as pequenas organizações para tratarem de questões historicamente marcadas pela injustiça social, fortalecendo a inclusão social e a justiça distributiva. Ao garantir um ambiente mais favorável para a participação ativa da sociedade civil, essas iniciativas promovem uma governança mais equitativa e responsiva às necessidades sociais, consolidando, assim, um modelo de gestão pública mais democrático e inclusivo.
9. REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Wedna Maria Tavares Mendonça de. Democracia Participativa e seus Instrumentos de Participação Popular: Virtudes e Dilemas, 2021. Disponível em: https://periodicos.unifacex.com.br/direito/article/view/990/342 . Acesso em: 07 de jul. 2024.
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Como citar esse artigo:
SOUZA, Maristela Palmeira de Barros. Democracia participativa: análise da parceria entre o estado da Bahia e as Organizações da Sociedade Civil, à luz da Lei Federal n.° 13.019/2014 e do Decreto Estadual n.º 17.091/2016. Revista QUALYACADEMICS. Editora UNISV; v. 2, n. 4, 2024; p. 05-21. ISSN: 2965-9760 | DOI: doi.org/10.59283/unisv.v2n4.001
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