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BREVE ANÁLISE DO PRINCÍPIO DA SELETIVIDADE TRIBUTÁRIA COMO MECANISMO EXTRAFISCAL

Caio Manoel Clementino de Alcântara

BRIEF ANALYSIS OF THE PRINCIPLE OF TAX SELECTIVITY AS AN EXTRA-FISCAL MECHANISM







Como citar esse artigo:


ALCÂNTARA, C. M. C. Breve análise do princípio da seletividade tributária como mecanismo extrafiscal. Revista QUALYACADEMICS. Editora UNISV; n.1, v.1, 2023; p. 178-185. ISBN 978-65-981287-6-0 - D.O.I.: doi.org/10.59283/ebk-978-65-981287-6-0


Autor:


Caio Manoel Clementino de Alcântara


https://orcid.org/0009-0005-2891-4079. Especialista em Direito Tributário pela Faculdade Única (2019). Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Faculdade Única (2020). Bacharel em Direito pela Universidade Regional do Cariri - Urca (2019). Advogado e Analista Legislativo - Direito - na Assembleia Legislativa do Estado do Ceará.



RESUMO


A Constituição Federal do Brasil de 1988, ao estabelecer o princípio da seletividade, determina que o objeto da tributação deve ser diferenciado conforme o grau de essencialidade. Dessa forma, este estudo tem como objetivo analisar como a seletividade é utilizada pelo Fisco para intervir na economia do contribuinte, abordando os impostos seletivos e extrafiscais e fornecendo definições claras dos conceitos relacionados. Para isso, a pesquisa se baseou em uma revisão bibliográfica focada na temática principiológica proposta em vários artigos científicos, bem como na análise da legislação, obras doutrinárias e jurisprudência dos tribunais brasileiros. Em conclusão, verificou-se que o ente estatal tem a capacidade de empregar a seletividade tributária como meio de influenciar o comportamento econômico do sujeito ativo, independentemente de sua função arrecadatória.


Palavras-chave: Seletividade. Mecanismo extrafiscal. Direito Tributário. Extrafiscalidade.


ABSTRACT


The 1988 Brazilian Federal Constitution, in establishing the principle of selectivity, dictates that the object of taxation should be differentiated according to its level of essentiality. Thus, this study aims to analyze how selectivity is employed by the Tax Authority to intervene in the taxpayer's economy, addressing selective and extra-fiscal taxes while providing clear definitions of related concepts. To achieve this, the research relied on a bibliographic review focused on the proposed principiological theme in various scientific articles, as well as an analysis of legislation, doctrinal works, and jurisprudence from Brazilian courts. In conclusion, it was found that the state entity has the ability to use tax selectivity as a means to influence the economic behavior of the active subject, regardless of its revenue-generating function.


Keywords: Selectivity. Extra-fiscal mechanism. Tax Law. Extrafiscality.


1. INTRODUÇÃO


Sabe-se que, na legislação tributária, há um vasto grupo de normas principiológicas que abarcam e refletem as relações entre o Fisco e os sujeitos, são representados pelas figuras dos contribuintes e/ou responsáveis. Tais normas são específicas e expressas na Constituição Federal (CF), bem como são encontradas no próprio Código Tributário Nacional (CTN), as quais são consideradas limites ao poder de tributar.


A respeito dos princípios tributário, a Constituição Federal, em seu art. 153, § 3º, inciso I, objetivando restringir a competência tributária do imposto sobre produtos industrializados, conhecido como IPI, reconheceu o princípio da seletividade, instrumento fiscal de grande valia, que ensina que a tributação de um produto industrializado deve considerar a sua essencialidade.


Do mesmo modo, a CF estabeleceu que o imposto relativo à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS), de competência dos Estados e Distrito Federal, terá uma faceta seletiva, consoante art. 155, § 2º, inciso III, do texto constitucional.


Por sua vez, pode-se afirmar que a tributação possui três finalidades precípuas: fiscal, parafiscal e extrafiscal.


Quanto ao princípio abordado na presente pesquisa, importa a última função, que de destaca por conferir ao Estado o poder de influenciar economicamente o comportamento dos sujeitos da relação tributária.


Assim, este artigo se baseou na seguinte premissa: Como a seletividade pode ser utilizada pelo Estado como forma de extrafiscalidade? Quais são os tributos seletivos e extrafiscais?


Nessa perspectiva, o objetivo central do trabalho é analisar a intervenção econômica do Estado, valendo-se da característica seletiva dos tributos, a citar o IPI e o ICMS.


Portanto, para atingir os objetivos elencados anteriormente, fora selecionada a metodologia de revisão e análise bibliográfica, através de estudos específicos sobre a matéria abordada na literatura tributária, em especial artigos científicos publicados nos mecanismos eletrônicos, leitura da legislação (CF e CTN), doutrina e jurisprudência.


A priori, será realizada uma contextualização sobre o instituto da seletividade e os impostos que possuem tal caraterística; adiante, serão explanadas as finalidades da tributação, sobressaltando a extrafiscalidade; e, por fim, será externalizado como o Estado se vale da faceta seletiva dos impostos.


2. DESENVOLVIMENTO


A Carta Maior fundou-se em normas principiológicas que objtivam a instituição do Estado de Direito, assegurando ao homem uma vida em sociedade equilibrada, possibilitando assim, tudo que lhe é de direito. Com isso, os princípios são responsáveis por interligar o texto normativo e o comportamento do cidadão que a ele se sujeita.


Os princípios que se aplicam no âmbito da economia demarcam a atuação do Estado e conduzem a imposição de normas-princípios no que tange às finanças (SOUZA, 2014, p.4).


Levando em consideração a afirmação anterior, entende-se que os princípios do Direito Tributário possibilitam uma direção do legislador na hora de estabelecer as alíquotas, considerando a repartição dos rendimentos e a necessidade de arrecadação dos tributos.


É sabido que o princípio da seletividade impõe que o tributo deve ser cobrado em função da sua necessidade para o contribuinte. A contrario sensu, significa que quanto menos essencial para o sujeito for o objeto tributado, haverá maior carga tributária sobre ele, e menor serão as alíquotas dos produtos essenciais, com o fim de facilitar o acesso a tais produtos.


Depreende-se que a observância da seletividade pode ser obrigatória ou facultativa, a depender de qual imposto incidirá, levando em consideração a literalidade dos dispositivos constitucionais.

O art. 153, § 3º, inciso I, da CF dispõe que o IPI, imposto de competência da União, “será seletivo, em função da essencialidade do produto”. A partir disso, verifica-se que a imposição do caráter seletivo é obrigatória.


No entanto, em relação ao ICMS, a seletividade será facultativa, já que consta no art. 155, § 2º, inc. III, também do Carta Maior, que “poderá ser seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços”.


Para Marques e Angelo (2012), “da exegese literal pura e simples deste dispositivo constitucional pode-se concluir, equivocadamente que, enquanto para o IPI o constituinte originário previu a obrigatoriedade de se observar o princípio da seletividade, no caso do ICMS, foi prevista uma mera faculdade.”


Ademais, pode-se elencar alguns exemplos, de acordo com Castro e Ribeiro ( s. d., p. 18), “no caso do cigarro, a tributação será alta, enquanto para a aquisição de um pacote de arroz, a tributação será baixa, devido se tratar de um produto essencial”.


A tributação pressupõe a função do Fisco direcionada precipuamente à arrecadação de valores necessários à manutenção da máquina estatal. Tal função é o atributo da fiscalidade da tributação.


Todavia, nem sempre um tributo possui como fim único o relativo à arrecadação de dinheiro aos cofres do governo. Ao lado dessa finalidade, há outras circunstâncias em que o tributo desempenha papéis diversos, com o intuito de atingir metas desejadas.


Um tributo goza de parafiscalidade quando é se dirige a abastecer os recursos financeiros de entidades com atribuições específicas, isto é, quando os valores arrecadados são recolhidos para entidades não pertencentes ao Estado.

Nessa hipótese, cita-se o caso das contribuições previdenciárias que, anteriormente à instituição da Secretaria da Receita Previdenciária, eram exigidas pelo Inistituto Nacional do Seguro Social, o qual detinha a disponibilidade dos mesmos recursos levantados.

Sobre a temática, Borba ensina:


Importante chamar a atenção para o fato de que somente a União poderá instituir contribuições parafiscais em geral, só cabendo aos Estados, Distrito Federal e Municípios, conforme art. 149, § 1°, da Constituição Federal, instituir contribuições sociais em benefício dos seus servidores, para o regime previdenciário de que trata o art. 40 da mesma Carta Magna, com redação da Emenda Constitucional n° 41, de 2003 (BORBA, 2015, p. 50).

Por sua vez, a extrafiscalidade, que mais interessa nessa obra, se traduz no emprego de mecanismos tributários para alcançar fins não arrecadatórios. Se resume em atividades incentivadoras ou inibitórias de comportamentos. Tem como objetivo atingir à realização de outros valores, constitucionalmente contemplados.

Para Sabbag:


O tributo possui finalidade extrafiscal quando objetiva fundamentalmente intervir numa situação social ou econômica. São os casos, entre outros, dos impostos de importação e exportação, que, antes de arrecadar, objetivam o controle do comércio internacional brasileiro, podendo, às vezes, servir de barreira protetiva da economia nacional e outras de estímulo à importação ou exportação de determinada espécie de bem (SABBAG, 2017, p. 115).

A extrafiscalidade constitui marca característica dos impostos regulatórios de mercado, porém pode ser observarda em impostos sobre a propriedade, como o IPVA, cujas alíquotas são estabelecidas conforme com o tipo e uso do veículo, além do IPTU e do ITR, que são impostos progressivos nas situações de inobservância do atendimenton à função social da propriedade.


Para Coelho, "a extrafiscalidade se caracteriza justamente pelo uso e manejo dos tributos, com a finalidade de atingir alvos diferentes da simples arrecadação de dinheiro" (COELHO, 2005, p. 89).


São exemplos de impostos dotados da função da extrafiscalidade: como o Imposto sobre a Importação (II), Imposto sobre a Exportação (IE), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguros (IOF).


A título de informação, com a instituição IPI buscou-se que o mesmo funcionasse como imposto extrafiscal, onerando a carga tributária dos produtos supérfluos, bem como daqueles prejudiciais, por exemplo as bebidas e os cigarros.

De acordo com Carvalho:


Impondo que as alíquotas do imposto sejam estipuladas seletivamente, em função do grau de essencialidade dos produtos, serviu-se, para tanto, da divisão dos produtos em três categorias: a) necessárias à sobrevivência (alíquotas); b) úteis, mas não necessários (alíquotas moderadas) e c) produtos de luxo (alíquotas significativas) (Carvalho, 2007, p.75).

A função não proibiu absolutamente a comercialização desses objetos, em outras palavras, ninguém abdicou o consumo deles porque a bebida ou o cigarro custasse mais, em função do aumento do imposto. Contudo, essa função extrafiscal interfere na hora do consumo, pesando relevantemente na hora da decisão final do consumidor.


Seguindo esse raciocínio, pode-se dizer que a faceta seletiva dos tributos se traduz em uma técnica de aplicação de alíquotas que se materializa em virtude da essencialidade do produto e constitui uma forma de realização da extrafiscalidade.


Vislumbra-se que a incidência da seletividade em produtos e serviços, desde que observada a aplicação do princípio da capacidade contributiva, torna possível a efetivação da justiça fiscal, o que proporciona uma divisão justa da carga dos tributos, quanto ao sujeito passivo, e de receitas, quanto ao sujeito ativo, ou seja, o Fisco.


Sobre a questão tratada, ressaltando o exposto, Menescal (2007, p.10) preceitua que “tributação seletiva é um instrumento concretizador da justiça fiscal porque seleciona os contribuintes a partir dos signos presuntivos de riqueza que estes emitem ao demonstrarem seus hábitos ou padrões de consumo”.

Desta maneira, através do princípio da seletividade, a máquina estatal interfere na economia, priorizando o consumo de certos bens, dada a sua necessidade, e reduzindo o consumo de bens considerados prescindíveis, por exemplo perfumes, ou mesmo nocivos, a citar os cigarros.


Portanto, salienta-se que o Princípio tributário da Seletividade equivale a um meio de observância à norma constitucional da capacidade contributiva dos cidadãos (CASALINO, 2012, p.123), como indicador de que o legislador tem o dever de respeitar outros princípios, que não possuem existência isolada, como o da dignidade da pessoa humana e, especialmente, o caráter essencial dos produtos e serviços tributados, interferindo no estabelecimento das alíquota no momento da criação do tributo por lei.


3. CONCLUSÃO


Visando organizar a vida social e estruturar um Estado de Direito, tornou-se indispensável a criação de regras para manter uma coexistência pacífica. Assim, foi criado o um ordenamento jurídico tributário, a fim se assegurar arrecadação do Fisco em face aos cidadãos.


Tal ordenamento é composto de princípios, os quais devem ser levados em conta no momento de produção das normas jurídicas, já que asseguram a dignidade da pessoa humana e outras regras que garantem isonomia e justiça social.


Assim, conclui-se que a seletividade possibilita que o Poder Público interfira no comportamento de consumo dos cidadãos, configurando, então, uma dose de extrafiscalidade.


Por sua vez, a seletividade se revela em um mecanismo para se buscar uma tributação justa e isonômica, até onde for possível, respeitando a regra da capacidade contributiva, e levando em consideração outros valores tributários e econômicos. Portanto, é necessário que a comunidade social fiscalize e busque que o Estado cumpra com os direitos fundamentais de maior envergadura, objetivando a efetivação da extrafiscalidade.


Por fim, é notório que a seletividade é um instrumento estatal que garante a faceta extrafiscal aos tributos, especialmente ao ICMS e IPI, que incidem de forma menos onerosa em bens essenciais à sociedade, respectivamente de forma facultativa e compulsória.



REFERÊNCIAS


BORBA, Cláudio. Direito Tributário. - 27. ed. - Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2015, p. 50.


BRASIL (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em 20 de maio de 2019.


BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Código Tributário Nacional. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5172Compilado.htm. Acesso em 21 de maio de 2019.


CARVALHO, Paulo de Barros. Introdução ao estudo do imposto sobre produtos industrializados. In: Revista de direito público, Londrina, v. 2, n. 1, p. 75, jan./abr. 2007.


CASALINO, Vinícius. Teoria Geral e Direito Constitucional Tributário. Curso de direito tributário e processo tributário, volume I. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 123.


CASTRO, Aldo Aranha; RIBEIRO, Maria de Fátima. Princípios constitucionais tributários, imunidades, isenções e as limitações ao poder de tributar. São Paulo, s. d., p. 18. Disponíovel em: http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=fa84632d742f2729. Acesso em 26 de maio de 2019.


COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 89.


MARQUES, Rogério César; ANGELO, Luiz Raphael Vieira. Interpretação constitucional do princípio da seletividade tributária no IPI e no ICMS. 2012. Disponível em: http://www.fiscosoft.com.br/a/5sav/interpretacao-constitucional-do-principio-da-seletividade-tributaria-no-ipi-e-no-icms-rogerio-cesar-marques-luiz-raphael-vieira-angelo. Acesso em: 01 de junho de 2019.


MENESCAL, Ana Mônica Filgueiras. A seletividade como instrumento concretizador da justiça fiscal no âmbito do ICMS. 2007. Disponível em http://livros01.livrosgratis.com.br/cp041427.pdf. Acesso em 24 de maio de 2019.


SABBAG, Eduardo. Código Tributário Nacional comentado. - 1. ed. - Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2017.


SOUZA, Leonardo Nunes. Tributação e desenvolvimento econômico: o ICMS e seu impacto nas operações interestaduais. 2014. Disponível em http://periodicos.pucminas.br/index.php/Direito/article/view/P.23187999.2014v17n33p210/7021. Acesso em 01 de junho de 2019.


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Esse artigo pode ser utilizado parcialmente em livros ou trabalhos acadêmicos, desde que citado a fonte e autor(es).



Como citar esse artigo:


ALCÂNTARA, C. M. C. Breve análise do princípio da seletividade tributária como mecanismo extrafiscal. Revista QUALYACADEMICS. Editora UNISV; n.1, v.1, 2023; p. 178-186. ISBN 978-65-981287-6-0 - D.O.I.: doi.org/10.59283/ebk-978-65-981287-6-0.


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