A REFORMA DA PREVIDÊNCIA DE 2019: EFEITOS E DESAFIOS PARA A SEGURIDADE SOCIAL BRASILEIRA
- Daniely Freitas Tragodara
- 26 de jun.
- 39 min de leitura
Atualizado: 29 de jun.
THE 2019 PENSION REFORM: EFFECTS AND CHALLENGES FOR BRAZIL’S SOCIAL SECURITY SYSTEM
Informações Básicas
Revista Qualyacademics v.3, n.2
ISSN: 2965976-0
Tipo de Licença: Creative Commons, com atribuição e direitos não comerciais (BY, NC).
Recebido em: 06/06/2025
Aceito em: 08/06/2025
Revisado em: 17/06/2025
Processado em: 21/06/2025
Publicado em: 26/06/2025
Categoria: Artigo de revisão
Como citar esse material:
TRAGODARA, Daniely Freitas; SERRA, Luan Henrique Muniz; BEZERRA, Nara Cibele Braña. A reforma da previdência de 2019: efeitos e desafios para a seguridade social brasileira. Revista QUALYACADEMICS. Editora UNISV; v.3, n.1, 2025; p. 641-675. ISSN 2965976-0 | D.O.I.: doi.org/10.59283/unisv.v3n2.023
Autores:
Daniely Freitas Tragodara
Graduada em Tecnologia de Gestão Ambiental pela Universidade Norte do Paraná – UNOPAR. Universitária do curso de Direito pela Universidade da Amazônia – UNAMA (Rio Branco). – Contato: daniely2319@gmail.com
Luan Henrique Muniz Serra
Universitário do curso de Direito pela Universidade da Amazônia – UNAMA (Rio Branco). – Contato: luanmuniz57@gmail.com
Nara Cibele Braña Bezerra
Mestre em Direito pela Universidade de Marília – UNIMAR – Universidade de Marília e Centro Universitário U:verse, Especialista em Direito Processual Civil pela UCAM – Universidade Cândidos Mendes, Analista Judiciária do Tribunal Regional Federal da 1ª Região Seccional Acre, Professora do Curso de Direito no Instituto de Pesquisa, ensino e de estudos das culturas amazônicas - INEC e professora do curso de Direito da UNAMA. – Contato: nara.bezerra@trf1.jus.br
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RESUMO
A Emenda Constitucional n.º 103, aprovada em 2019, implementou a Reforma da Previdência, promovendo alterações significativas no sistema previdenciário brasileiro. O principal objetivo da reforma foi reduzir o déficit financeiro e garantir a sustentabilidade do sistema de seguridade social como um todo. Entre as mudanças mais relevantes destaca-se a introdução de uma idade mínima para aposentadoria e o aumento do tempo de contribuição exigido. Embora a proposta tenha buscado equilibrar as contas públicas e assegurar a continuidade de serviços essenciais relativos à seguridade social, como a saúde, educação e aposentadoria, a reforma impôs desafios consideráveis aos trabalhadores mais vulneráveis, especialmente àqueles com vínculos informais ou instáveis. As mulheres, que frequentemente enfrentam interrupções na carreira devido a responsabilidades familiares, foram particularmente impactadas, encontrando maiores dificuldades para atender aos novos critérios de aposentadoria. A análise revela tanto aspectos positivos como o fortalecimento do sistema previdenciário quanto a necessidade de atenção à exclusão de determinados grupos que enfrentam barreiras para acessar os benefícios sob as novas regras. Assim, torna-se fundamental o monitoramento contínuo dos efeitos da reforma, a fim de garantir uma proteção social adequada e inclusiva para todos os trabalhadores e contribuintes brasileiros.
Palavras-chave: Seguridade Social; Reforma da Previdência; Aposentadoria; Impactos Sociais; Emenda Constitucional n.º 103.
ABSTRACT
Constitutional Amendment No. 103, approved in 2019, implemented the Pension Reform, promoting significant changes to the Brazilian pension system. The main objective of the reform was to reduce the financial deficit and ensure the sustainability of the social security system as a whole. Among the most relevant changes are the introduction of a minimum retirement age and the increase in the required contribution period. Although the proposal sought to balance public accounts and ensure the continuity of essential social security services, such as health, education and retirement, the reform imposed considerable challenges on the most vulnerable workers, especially those with informal or unstable employment relationships. Women, who often face career interruptions due to family responsibilities, were particularly impacted, finding it more difficult to meet the new retirement criteria. The analysis reveals both positive aspects, such as the strengthening of the pension system, and the need to address the exclusion of certain groups that face barriers to accessing benefits under the new rules. Therefore, it is essential to continuously monitor the effects of the reform in order to ensure adequate and inclusive social protection for all Brazilian workers and taxpayers.
Keywords: Social Security; Pension Reform; Retirement; Social Impacts; Constitutional Amendment No. 103.
1. INTRODUÇÃO
Versa o presente artigo sobre os impactos advindos da reforma da previdência social, através da Emenda Constitucional nº 103, promulgada em novembro de 2019, alterando as da aposentadoria, benefícios assistenciais e pensões.
A importância desse tema é evidente, tamanha a sua repercussão sobre a vida de milhões de brasileiros que dependem do amparo estatal para suprir suas necessidades básicas com alimentação, vestuário, higiene, saúde e educação.
Contudo, a sociedade brasileira vem vivenciando há décadas uma espécie de conflito entre as crescentes necessidades da população e os crescentes gastos que, consumem quantia significativa do orçamento público, uma vez que o pagamento das contribuições pelos cidadãos, empresas públicas e privadas e as diferentes esferas de governo não conseguem cobrir o déficit previdenciário, sendo necessário o remanejamento de verba pública de outras áreas para custeá-lo.
Isso ocasiona o desequilíbrio das contas públicas e exige a adoção de medidas saneadoras, sob pena de descontrole do orçamento público com prejuízos para a economia e vida de todos nós. Por essa razão, o governo federal vem promovendo, por meio de diversas emendas constitucionais, sucessivas alterações no texto da Carta Magna visando corrigir o problema, mas até o momento, por razões diversas, como será visto adiante, ainda não alcançado o fim pretendido.
Esse tema, além de importante é muito complexo e exigiria uma análise extensão que foge aos objetivos deste artigo. Sem perder de vista a necessária profundidade, buscou a expor o tema de modo didático, com linguagem simples e acessível a todos.
Para tanto, utilizou-se uma ampla revisão bibliográfica, pesquisa em sites de notícias, trabalhos acadêmicos publicados e dados oficiais. Dividiu-se o texto em tópicos a partir da contextualização história do surgimento da seguridade social, em seguida abordou-se sua inserção nas diversas constituições brasileiras, com destaque para a estrutura criada pela Constituição de 1988 e suas emendas. Por fim, o artigo apresentará, especificamente, as mudanças introduzidas pela referida Emenda Constitucional nº 103, seu impacto e resultados sobre a sociedade e os menos favorecidos.
2. FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E JURÍDICOS DA PROTEÇÃO SOCIAL
Assumpção (2023) destaca que, em seus primórdios, a seguridade social manifestava-se por meio de formas rudimentares de auxílio mútuo, restritas ao núcleo familiar. Antes mesmo de qualquer formalização institucional, essas práticas já expressavam a busca coletiva por proteção diante das adversidades da vida. Com o tempo, transformou-se em uma estrutura normativa que passou a compor os direitos fundamentais dos cidadãos em diversas partes do mundo.
Na mesma esteira, Braga (2018) leciona que, nos períodos mais remotos, a proteção aos vulneráveis era atribuída às estruturas familiares, nas quais os membros mais jovens cuidavam dos idosos e incapacitados. Essa prática, embora informal, era essencial para a sobrevivência coletiva.
Posteriormente, surgiram outras formas de proteção aos mais necessitados, por exemplo, sobretudo entidades beneficentes, algumas formas de grêmios e confrarias.
As entidades beneficentes, enquanto primeira forma de proteção dos hipossuficientes, observavam o princípio cristão de caritas (caridade), ou amor ao próximo. Nessa fase, a Igreja teve papel preponderante ao criar diversas entidades assistenciais. Como explica Assumpção (2023), a beneficência era conduzida por motivações religiosas e morais, visando aliviar o sofrimento dos pobres, órfãos e doentes. Era um serviço voluntário e desprovido de qualquer obrigação formal, sendo mais um dever moral do que um direito advindo de algum ato normativo. Ressalte-se que esse modelo, embora importante, era limitado e dependia da boa vontade dos agentes filantrópicos.
Durante a Idade Média, desenvolveram-se formas comunitárias de proteção social por meio de associações como os grêmios e as confrarias. Essas organizações buscavam oferecer algum nível de segurança e amparo aos seus membros, especialmente diante de situações adversas. Segundo Castro (2018), tais entidades podem ser consideradas precursoras dos sistemas modernos de proteção social. Embora ainda rudimentares, seus mecanismos de auxílio mútuo voltados, por exemplo, à assistência em casos de doença, acidentes ou funerais antecipavam práticas que depois seriam institucionalizadas sob a forma de seguros sociais.
O surgimento da assistência social pública, tal como a conhecemos hoje, representou um salto qualitativo, ainda que, inicialmente, essa assistência não fosse considerada um direito, mas uma expectativa de amparo pelo Estado.
Pode-se considerar como marco inicial dessa forma de amparo aos necessitados, a Poor Law Act (Lei dos Pobres), editada na Inglaterra no séc. XVII. Segundo este Ato:
[...] cada paróquia deveria assumir a responsabilidade pelos pobres que correspondessem a seu território. Os pobres, por sua vez, eram divididos em três categorias distintas: os “impotentes”, que correspondiam aos velhos e adoecidos, os aptos ao trabalho e aqueles que se recusavam a trabalhar. Ao primeiro grupo seria garantido cuidado, ao segundo trabalho, e ao último punição (Castellano, 2016, p. 13).
Depreende-se, pois, que nesta época acolhimento dos mais necessitados era feito pelas paróquias locais em um modelo descentralizado de assistência. Além disso, os pobres eram divididos em categorias conforme critérios morais: os “impotentes” recebiam cuidados, os aptos ao trabalho eram compelidos a trabalhar e os que se recusavam eram punidos. Essa classificação hierarquizada, baseada em conduta e mérito, legitimava práticas de exclusão e ainda repercute em modelos assistenciais atuais. O legado dessa lógica moralizante reforça a necessidade de políticas sociais contemporâneas centradas na dignidade humana e na universalização dos direitos e não alicerçada em aspectos ético-religiosos.
Um marco importante neste processo de evolução histórica da seguridade social pública, aconteceu com a implementação da chamada Revolução Industrial.
De acordo com artigo publicado por Neves; Souza (s.d.) no site Mundo e Educação, a Revolução Industrial foi um processo de profundas transformações econômicas, tecnológicas e sociais que teve início na Inglaterra, no final do século XVIII, e se espalhou para outros países ao longo do século XIX. Caracterizou-se principalmente pela substituição do trabalho manual pelo uso de máquinas, pela introdução de novas fontes de energia, como o carvão e o vapor, e pelo surgimento de indústrias organizadas em fábricas. Esse período marcou a transição de uma economia agrária e artesanal para uma economia urbana, industrial e capitalista, resultando no aumento significativo da produção de bens e no crescimento das cidades.
Ainda de acordo com esses autores, no âmbito social, a Revolução Industrial teve impactos marcantes. A urbanização acelerada levou à formação de grandes centros urbanos, muitas vezes sem a infraestrutura adequada, o que gerou péssimas condições de vida para os trabalhadores. A classe operária, formada por camponeses que migraram para as cidades, enfrentava jornadas de trabalho exaustivas, baixos salários e ambientes de trabalho insalubres. Ao mesmo tempo, consolidou-se uma nova divisão de classes, com o fortalecimento da burguesia industrial e o surgimento de movimentos operários em busca de melhores condições de trabalho e direitos sociais. Assim, a Revolução Industrial não apenas transformou os modos de produção, mas também redesenhou profundamente as estruturas sociais e as relações humanas.
Diante desse cenário, tornou-se necessária a intervenção contundente do Estado na condução de políticas sociais que efetivamente atendessem aos anseios da população. Como leciona Guimarães (2024), o sistema estatal de seguridade social substituiu a lógica voluntária da assistência social por uma estrutura normativa e compulsória. No mesmo sentido, Rocha e Müller (2021) afirmam que o Estado passou a exercer um papel ativo tanto na regulação das relações sociais quanto na garantia de condições mínimas de sobrevivência aos cidadãos.
O fortalecimento da concepção de proteção estatal resultou na criação dos seguros sociais e, posteriormente, na consolidação dos modernos sistemas de seguridade social, tendo a Revolução Industrial desempenhado papel decisivo nesse processo, segundo Temóteo (2018) o advento da Revolução Industrial escancarou a precariedade das condições de trabalho e a vulnerabilidade dos operários. Surgindo nessa época os primeiros seguros sociais compulsórios, que institucionalizaram a proteção do trabalhador como uma obrigação do Estado e um direito do cidadão.
A constitucionalização do direito à seguridade e previdência social é um fenômeno recente na história do constitucionalismo. Inicialmente, as constituições do século XIX e início do século XX se limitaram a garantir direitos civis e políticos, com foco na proteção das liberdades individuais. Posteriormente, frente às constantes mudanças sociais, esses direitos passaram a integrar a estrutura normativa dos textos constitucionais.
Segundo Bobbio (2004, p. 34), os direitos sociais surgem em um segundo momento do desenvolvimento histórico dos direitos humanos, quando se passa da simples defesa da liberdade individual para a exigência de condições materiais mínimas para o exercício dessa liberdade: “os direitos sociais não substituem os direitos de liberdade, mas os completam”.
A transformação desse paradigma começou a se consolidar com o advento do Estado Social, após a Primeira Guerra Mundial. Um marco importante foi a Constituição de Weimar, de 1919, na Alemanha, que pela primeira vez inseriu de forma explícita direitos sociais em um texto constitucional. Essa constituição estabeleceu, por exemplo, o dever do Estado de proteger o trabalho, garantir o seguro social e promover a justiça social. Conforme aponta Sarlet (2012, p. 105), “a Constituição de Weimar representou a primeira tentativa sistemática de institucionalização dos direitos sociais no plano constitucional, abrindo caminho para outras experiências constitucionais similares”.
No período pós-Segunda Guerra Mundial, a positivação dos direitos sociais nas constituições nacionais ganhou impulso com o reconhecimento internacional desses direitos como parte integrante dos direitos humanos. A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, em seu artigo 22, afirma que “toda pessoa, como membro da sociedade, tem direito à seguridade social”, reforçando o dever do Estado de garantir um mínimo existencial para seus cidadãos.
Além disso, a Constituição Italiana de 1947 e a Constituição Espanhola de 1978 também representaram avanços significativos nesse campo. Para Bastos (2000, p. 97), essas constituições “revelaram um novo modelo constitucional, em que os direitos sociais, entre eles a previdência e a assistência, não apenas são reconhecidos, mas incorporados ao núcleo essencial do pacto constitucional”.
Na América Latina, constituições como a do México (1917) e do Brasil (1988) apresentam dispositivos robustos sobre a seguridade social. A Constituição Brasileira de 1988, notoriamente conhecida como “Constituição Cidadã”, representa um marco nesse processo ao estabelecer um sistema tripartite de seguridade social — saúde, previdência e assistência social — e atribuir ao Estado a responsabilidade de garantir a universalidade da cobertura e do atendimento, a equidade no financiamento e a uniformidade e equivalência dos benefícios.
Assim, o histórico da constitucionalização dos direitos da seguridade e previdência social revela uma progressiva incorporação desses direitos como garantias fundamentais do ser humano, superando a visão puramente assistencialista e reconhecendo-os como instrumentos essenciais para a dignidade, a justiça social e a igualdade material.
Com relação ao Brasil, de acordo com Cruz (2015) e Menezes (2024), a “estatização” da seguridade social teve um início tímido já na Constituição de 1824, promulgada ainda sob a égide do período imperial, estabeleceu apenas que deveria ser prestada a assistência aos mais vulneráveis que necessitavam de cuidados de saúde, os chamados “socorros públicos”. Nesse período, essas atividades eram desenvolvidas por meio das santas casas de misericórdia, a exemplo da Santa Casa da Misericórdia de Santos, em 1553.
A segunda Constituição brasileira (1891) e primeira do período republicano, pouco acrescentou à realidade da carta constitucional anterior, garantindo, apenas, a aposentadoria exclusivamente a servidores públicos em caso de invalidez decorrente da prestação de serviços à nação.
Por seu turno, leciona Cruz (2015) que:
Na verdade, a previdência social brasileira foi implantada com a Lei Eloy Chaves, estabelecida pelo Decreto Legislativo 4.682/1923, que criou as chamadas Caixas de Aposentadoria e Pensões para os empregados das empresas ferroviárias, contemplando os benefícios de aposentadoria por invalidez, aposentadoria ordinária (atualmente chamada de aposentadoria por tempo de contribuição), pensão por morte, bem como o benefício de assistência médica, todos eles custeadas por contribuições do Estado, dos empregadores e dos trabalhadores.
A Constituição de 1934, na verdade, lançou as bases da previdência social brasileira. Foi ela que instituiu as modernas formas de custeio (governo, empregadores e empregados privados), bem como os benefícios de doença, invalidez e morte. Já a Constituição de 1937, trouxe como principal característica a maior centralização estatal sobre os mecanismos de proteção social.
A Constituição de 1946, elaborada após o fim do Estado Novo, consolidou a previdência social como parte dos direitos dos trabalhadores urbanos e reafirmou a responsabilidade do Estado na sua manutenção, num contexto de redemocratização do país. No entanto, o sistema ainda era fragmentado, com múltiplos institutos de previdência para diferentes categorias, o que gerava desigualdades de acesso e cobertura assistencial deficitária. Na lição de Cruz (2015):
A Constituição brasileira de 1946 utilizou, de forma inédita, a expressão ‘previdência social’, e instituiu o mecanismo de ‘contrapartida’, como forma de manter o equilíbrio entre receita e despesas dentro do Sistema da Seguridade Social, bem como passou a proteger expressamente os denominados riscos sociais.
Já a Constituição de 1967, sob o regime militar, reforçou o caráter contributivo do sistema, enfatizando a vinculação entre o custeio e o acesso aos benefícios, bem como promoveu a centralização a gestão dos benefícios previdenciários com a criação do Instituto Nacional de Previdência Social – INPS, em 1966, que unificou os diversos institutos de aposentadoria e pensão que, até então, eram organizados por categoria profissional. A criação do INPS teve, portanto, como objetivo racionalizar a gestão previdenciária, reduzir custos administrativos e ampliar o controle estatal sobre o sistema. Apesar dessa centralização, o modelo ainda era limitado à lógica securitária, baseada na contribuição dos trabalhadores formais urbanos, excluindo grande parte da população rural e informal do acesso à proteção previdenciária.
Apesar de avanços pontuais, como a ampliação da cobertura para trabalhadores rurais a partir da década de 1970, as constituições anteriores não representam um modelo integrado de seguridade social, como viria a ser consagrado pela Constituição de 1988, que representou um marco nesse processo, ao reconhecer expressamente a assistência social como um direito do cidadão e dever do Estado. A partir desse fundamento constitucional, foram estruturadas políticas públicas voltadas à proteção dos segmentos mais vulneráveis da população, como os benefícios assistenciais e previdenciários.
Portanto, em 100 anos de história, a seguridade social brasileira passou por muitas transformações, especialmente, a previdência passou a ter abrangência nacional, responsável pelo pagamento de 22,4 milhões de aposentadorias apenas no Regime Geral (que inclui trabalhadores da iniciativa privada e servidores não filiados a regimes próprios), com um desembolso anual superior a R$ 478,7 bilhões (Agência Senado, 2023). Nesta esteira, a Agência Senado (2023) acrescenta que decorridos mais de um século, a rede de proteção previdenciária, que em 1923 se restringia a aposentadoria, saúde e pensão por morte, evoluiu para uma gama de mais de 20 benefícios, auxílios e pensões. Além dos diversos tipos de aposentadoria, que variam de acordo com o perfil e o histórico de cada trabalhador, como se verá adiante.
Do exposto acima, pode-se concluir que, a consolidação constitucional da seguridade social no país, apesar dos avanços, não eliminou os desafios, promover e ampliar sua rede de amparo para abarcar o conjunto da sociedade.
Ademais, a sustentabilidade financeira dos sistemas previdenciários tornou-se tema recorrente de debate, especialmente diante do envelhecimento populacional e das mudanças no mercado de trabalho e é justamente sob essa ótica que as reformas recentes, como a Emenda Constitucional nº 103/2019, buscaram reequilibrar financeiramente o sistema.
Porém, como observa Lobato, Costa e Rizzoto (2019), essas medidas, embora justificadas sob a ótica fiscal, levantam preocupações quanto à preservação dos direitos sociais conquistados. O autor destaca ainda que as reformas previdenciárias, embora justificadas sob a ótica do equilíbrio fiscal, podem resultar no agravamento das desigualdades sociais, especialmente entre os trabalhadores de baixa renda e a população idosa. Diante disso, é fundamental que tais medidas sejam conduzidas com cautela e responsabilidade, de modo a não comprometer os princípios de justiça social que fundamentam o sistema de seguridade, assegurando a proteção dos segmentos mais vulneráveis da sociedade.
3. METODOLOGIA
Este estudo caracteriza-se como uma pesquisa de cunho analítico-descritiva, voltada à análise crítica dos efeitos sociais da Reforma da Previdência de 2019, instituída pela Emenda Constitucional nº 103. O enfoque qualitativo justifica-se pela complexidade do objeto de investigação, que envolve dimensões normativas, sociais e econômicas inter-relacionadas, exigindo uma compreensão interpretativa mais profunda do fenômeno estudado.
3.1. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
O levantamento de dados foi realizado por meio de pesquisa e revisão bibliográfica, com base em fontes primárias (textos legais, relatórios oficiais, normativos institucionais) e fontes secundárias (artigos acadêmicos, livros, dissertações e pareceres técnicos). As principais bases de dados consultadas foram: SciELO, Google Acadêmico, Periódicos CAPES, Jusbrasil, IBGE, IPEA e repositórios institucionais.
A coleta de dados ocorreu entre janeiro e maio de 2025, a partir dos seguintes critérios de seleção:
· Pertinência direta com o objeto de estudo (impactos da EC 103/2019);
· Atualidade;
· Relevância institucional ou acadêmica reconhecida;
· Diversidade de perspectivas, incluindo fontes críticas e governamentais.
3.2. ESTRATÉGIA DE ANÁLISE
A análise dos dados seguiu uma abordagem hermenêutica e crítica, a partir da interpretação de dispositivos constitucionais, normas infraconstitucionais e textos doutrinários, com foco na identificação de:
· Mudanças estruturais no sistema previdenciário;
· Impactos sociais diretos e indiretos da reforma;
· Efeitos diferenciais sobre grupos vulneráveis (gênero, renda, informalidade).
Foram utilizados quadros comparativos e gráficos descritivos para facilitar a visualização das alterações normativas e dos efeitos observados. A técnica de análise textual permitiu extrair categorias temáticas, como: “sustentabilidade fiscal”, “justiça distributiva”, “barreiras de acesso” e “desigualdades regionais e estruturais”.
3.3. DELIMITAÇÃO E ESCOPO
O estudo concentrou-se na análise do Regime Geral de Previdência Social - RGPS, responsável por cobrir a maior parcela da população economicamente ativa no Brasil, especialmente os trabalhadores do setor privado e os contribuintes individuais. O Regime Próprio de Previdência Social - RPPS, voltado a servidores públicos civis estatutários, será abordado de forma complementar, apenas nos aspectos em que houve interseção normativa ou impacto relevante.
Essa delimitação se justifica pela amplitude dos efeitos da reforma sobre o RGPS e pela necessidade de garantir profundidade analítica em vez de dispersão temática.
3.4. LIMITAÇÕES DA PESQUISA
Apesar do esforço em apresentar um panorama abrangente, reconhecem-se como limitações:
· A impossibilidade de acesso direto a entrevistas com beneficiários ou formuladores da política;
· O fato de que os efeitos de longo prazo da EC 103/2019 ainda estão em processo de consolidação e monitoramento.
Tais limitações não comprometem os resultados obtidos, mas indicam a necessidade de estudos complementares no futuro, a fim de aprofundar o entendimento dos efeitos da reforma no médio e longo prazo.
Dessa forma, a metodologia adotada permitiu não apenas identificar e sistematizar as principais alterações introduzidas pela Emenda Constitucional nº 103/2019, como também refletir criticamente sobre seus impactos sociais, especialmente entre os grupos mais vulneráveis da sociedade brasileira. Ao articular análise normativa e revisão teórica, o estudo busca oferecer subsídios relevantes para o debate acadêmico e institucional, contribuindo para a formulação de políticas públicas mais justas, inclusivas e sustentáveis no campo da seguridade social.
4. A SEGURIDADE SOCIAL NA CONSTITUIÇÃO DE 1988
Inicialmente, cumpre frisar que a Constituição de 1988 reestruturou todo o sistema da seguridade social brasileira, refletindo o momento histórico em que foi editada, no qual prevalecia o entendimento de que o Estado deveria assumir o papel principal de organizador, gestor e financiador do sistema.
A Carta Constitucional de 1988 trata desse importante tema no Título VIII, Capítulo II, compreendendo os artigos 194 a 204 e conceituando no artigo 194 a seguridade social como: “Um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social (Brasil, 1988, Cap. II, art. 194)”.
Deste artigo extrai-se, inicialmente, que o poder público e a sociedade são responsáveis pelas ações relativas à seguridade social. Um segundo aspecto a ser considerado é que a seguridade social se divide em três áreas: saúde, previdência e assistência social. Para fins do presente trabalho, interessa-nos estas últimas e, sobretudo, as alterações e impactos advindos da EC 103/2019 sobre elas.
O custeio do sistema de seguridade social foi disciplinado no art. 195, caput, nos seguintes termos:
A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das contribuições sociais (Brasil, 1988, Cap. II, art. 195).
Vê-se, pois, que no âmbito federal, deverá o orçamento da União prevê os custos necessários à seguridade social, devendo as demais esferas de governo (Estados, Distrito Federal e Municípios), também incluir em seus orçamentos anuais a forma de custeios de suas respectivas seguridades. O restante da sociedade participará através do pagamento de suas contribuições.
Ainda de acordo com o referido dispositivo, combinado com o art. 201 da CF/1988, instituiu-se um sistema contributivo e de filiação obrigatória, destinado a assegurar cobertura para trabalhadores nos casos de aposentadoria, invalidez, morte, desemprego involuntário, doença, maternidade e reclusão. Como destaca Giambiagi (2007), “a Constituição de 1988 universalizou o acesso à previdência, ao mesmo tempo em que ampliou significativamente o rol de benefícios e reduziu os requisitos de acesso, sobretudo para trabalhadores rurais”. Essa ampliação trouxe conquistas sociais históricas, como a inclusão definitiva dos trabalhadores rurais, que passaram a ter direito à aposentadoria por idade com valores equivalentes ao salário mínimo, independentemente da contribuição direta e com carência reduzida.
Quanto à assistência social, a Constituição de 1988 impulsionou a criação e regulamentação de programas como o Benefício de Prestação Continuada - BPC, previsto no artigo 203, inciso V, voltado a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda, mesmo que não tenham contribuído para a previdência. Essa medida ampliou a função social da Previdência e fortaleceu o caráter redistributivo do sistema. Como aponta Boschetti (2006), “a seguridade social brasileira assumiu, com a Constituição de 1988, um papel essencial na promoção da cidadania e na redução das desigualdades sociais”, ou seja, o BPC constitui-se em uma exceção ao sistema contributivo da previdência social, visto que busca amparar pessoas necessitada que não conseguem contribuir regularmente para o sistema.
A assistência social, diferentemente da previdência, passou a ser garantida a todos os cidadãos em situação de vulnerabilidade, independentemente de vínculo laboral ou histórico de pagamento de contribuições, conforme previsto no artigo 203 da Carta Magna (Brasil, 1988) com isso foi elevada ao status de direito social universal e dever do Estado, independentemente de qualquer contribuição à seguridade social.
Segundo esse dispositivo, a assistência social será prestada a quem dela necessitar, com o objetivo de proteger a família, a maternidade, a infância, a adolescência e a velhice, além de amparar crianças e adolescentes em situação de risco e promover a integração das pessoas com deficiência.
4.1. REFORMAS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
Conforme Lima; Sorto (2022):
O texto original da Constituição de 1988 tinha como foco a outorga de proteção abrangente aos trabalhadores urbanos e rurais. Buscava unificar os regimes previdenciários dos trabalhadores da iniciativa privada, sem descurar dos trabalhadores rurais, que foram ignorados ou colocados em situação de inferioridade em termos de proteção previdenciária nos períodos anteriores à Constituição atual.
Entretanto, logo surgiram preocupações e projeções a respeito das contas públicas e a possibilidade de prejudicar a economia. Assim, apenas 5 anos após a promulgação da Constituição de 1988 aconteceu a primeira reforma através da Emenda Constitucional nº 3, que os servidores públicos passaram a contribuir para custeio das aposentadorias e pensões do setor público.
Com a persistência do déficit previdenciário, em 1998 foi promulgada a Emenda Constitucional nº 20 que, por exemplo, extinguiu a aposentadoria por tempo de serviço, substituindo-a pela aposentadoria por tempo de contribuição, além de instituir uma idade mínima para servidores públicos.
Em 2003, foi promulgada a Emenda Constitucional nº 41 que alterou diversas regras dos regimes próprios dos servidores públicos, como por exemplo, a extinção do direito à integralidade e paridade nos benefícios da aposentadoria para os novos servidores, cálculo da aposentadoria baseado na média das remunerações, e não mais no último salário, bem como criação da contribuição previdenciária de aposentados e pensionistas do serviço público.
Como forma de compensar parte dos impactos da reforma de 2003, a Emenda Constitucional nº 47, de 2005, estabeleceu regras de transição mais brandas, permitindo, por exemplo, que servidores mais antigos ainda tivessem acesso à integralidade e paridade, desde que cumprissem certos requisitos adicionais de idade e tempo de contribuição.
A discussão sobre a justiça nos critérios de aposentadoria por invalidez levou à aprovação da Emenda Constitucional nº 70, em 2012. Essa norma restabeleceu o direito ao valor integral do benefício da aposentadoria para servidores públicos aposentados por invalidez permanente, desde que a causa estivesse relacionada a acidente de trabalho ou doença profissional.
Já em 2015, a Emenda Constitucional nº 88 alterou a regra da aposentadoria compulsória no serviço público, estendendo a idade limite de 70 para 75 anos, como forma de ajustar o sistema às novas realidades demográficas e à maior longevidade da população.
Por todo o exposto, depreende-se que as sucessivas reformas constitucionais relativas à previdência social e o sistema de seguridade como um todo, visaram resolver o crescente déficit previdenciário, ocasionando alterações e supressões de direitos previstos originalmente na Constituição de 1988.
5. MUDANÇAS ESTRUTURAIS DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 103/2019
Apesar da aprovação de seis emendas constitucionais e algumas leis ordinárias, o déficit previdenciário ainda é uma séria ameaça para a continuidade do sistema previdenciário e da seguridade social. Podendo inclusive, num futuro próximo, ocasionar impacto negativo nas contas públicas e prejudicar a estabilidade econômica do país.
Um dos principais fatores apontados como causa desse déficit é o envelhecimento populacional. Com o aumento da expectativa de vida e a redução das taxas de natalidade, a proporção de idosos cresce aceleradamente, enquanto a base de contribuintes encolhe. Segundo Giambiagi e Além (2011, p. 239), “o sistema previdenciário brasileiro enfrenta o desafio de financiar um número crescente de beneficiários com um número proporcionalmente menor de contribuintes”. Essa mudança demográfica compromete o equilíbrio atuarial, pois mais pessoas passam a receber benefícios por mais tempo, enquanto menos trabalhadores ativos contribuem.
Outro fator importante é a informalidade do mercado de trabalho, que reduz a arrecadação previdenciária. Muitos trabalhadores laboram sem carteira assinada ou são autônomos sem contribuição regular, o que gera uma base contributiva instável. Além disso, o sistema brasileiro é historicamente marcado por desonerações, renúncias fiscais e fraudes, que comprometem a arrecadação. Em 2024, por exemplo, segundo matéria publicada no site da CNN Brasil (2024), as renúncias previdenciárias ultrapassaram R$ 51 bilhões, volume inferior ao registrado no mesmo período de 2023 (R$ 62,52 bilhões).
O déficit também é agravado pelas distorções existente nos regimes próprios de previdência dos servidores públicos (civis e militares), especialmente, no âmbito federal, que tradicionalmente apresentam déficits expressivos porque o valor médio das aposentadorias é muito superior ao do setor privado, e há uma proporção maior de inativos em relação aos ativos. Por fim, a má gestão de recursos e a ausência de mecanismos de controle eficientes contribuem para o desequilíbrio financeiro.
A Emenda Constitucional nº 103, de 2019, insere-se precisamente nesse contexto de esforço do Estado para conter o agravamento do déficit previdenciário cuja evolução poderá tornar insustentável a existência da previdência e da seguridade social como um todo. A reforma promoveu mudanças estruturais tanto no Regime Geral quanto no Regime Próprio de Previdência Social dos Servidores Públicos.
Para estes, inicialmente, a EC nº 103/2019 concedeu, no § 15 do art. 40 da CF/1988, a possibilidade de criação, por meio de Lei Complementar, do custeio financeiro de capitalização individual. Esse modelo propõe que cada trabalhador tenha uma espécie de “conta vinculada individual”, na qual será acumulada sua contribuição e recebe, no futuro, apenas aquilo que acumulou acrescido dos rendimentos correspondentes.
Diferente do regime atual, que conta com a participação da União e dos servidores no financiamento do Regime Próprio. Cumpre salientar, ainda, que a capitalização transfere a responsabilidade exclusivamente ao segurado, que dependerá do saldo acumulado para garantir sua aposentadoria.
Além disso, a EC nº 103/2019, fixou uma idade mínima para a aposentadoria no Regime Geral de Previdência Social (RGPS): 65 anos para homens e 62 anos para mulheres. Antes da reforma, bastava cumprir um tempo mínimo de contribuição, sem exigência etária, o que permitia aposentadorias precoces e contribuía para o aumento do custo previdenciário.
Outra mudança significativa refere-se ao cálculo dos benefícios, em relação à nova legislação, o valor da aposentadoria passou a corresponder a 60% da média de todos os salários de contribuição, com acréscimo de 2% para cada ano que ultrapassar 20 anos de contribuição para os homens e 15 anos para as mulheres. Conforme observa Santo; Ribeiro (2019), essa alteração afeta especialmente os trabalhadores de média e alta renda, uma vez que a nova fórmula tende a reduzir substancialmente o valor final do benefício.
No âmbito do serviço público, os impactos também foram expressivos. A reforma instituiu idades mínimas específicas, regras de transição e a adoção de alíquotas de contribuição progressivas, que podem alcançar até 22% para os servidores com salários mais elevados. Para Lobato, Costa e Rizzoto (2019), tais medidas buscam aproximar as condições de aposentadoria dos servidores públicos às dos trabalhadores do setor privado, promovendo maior isonomia entre os regimes previdenciários.
A extinção da aposentadoria por tempo de contribuição sem exigência de idade mínima foi outro ponto relevante. Embora coerente com o objetivo de prolongar a permanência da força de trabalho no mercado, essa modificação impacta diretamente os segurados que iniciaram suas atividades laborais ainda na juventude, impondo-lhes um tempo adicional até que possam cumprir o novo critério etário.
A pensão por morte também passou por reformulação. Antes da EC nº 103/2019, os dependentes tinham direito ao valor integral do benefício do falecido. Com a nova regra, o valor inicial foi reduzido para 50%, acrescido de 10% por dependente, até o limite de 100%. Essa alteração representa uma diminuição significativa no montante final recebido, afetando diretamente famílias que dependem exclusivamente dessa fonte de renda. Em outras palavras, a nova regra da pensão por morte rompe com o paradigma de integralidade do benefício ao dependente, justificando-se pela necessidade de contenção de despesas, mas sacrificando a proteção familiar diante da perda do provedor (Santo; Ribeiro 2019).
Os trabalhadores rurais e os beneficiários do Benefício de Prestação Continuada - BPC tiveram seus direitos majoritariamente preservados na Emenda Constitucional nº 103/2019. Essa manutenção decorreu da intensa mobilização da sociedade civil e da atuação da oposição parlamentar, que reagiram de forma contundente às propostas iniciais da reforma. Como destaca Lobato, Costa e Rizzoto (2019), essa resistência foi essencial para evitar o endurecimento de exigências que poderiam comprometer o acesso à proteção social por parte desses grupos historicamente vulneráveis.
Portanto, a principal justificativa apresentada pelo governo federal para a aprovação da reforma foi a necessidade de garantir a sustentabilidade fiscal do sistema previdenciário. O envelhecimento da população brasileira, somado à redução contínua da taxa de natalidade, projeta um cenário de desequilíbrio estrutural nas contas públicas. Nesse sentido, Ferreira; Azevedo (2024) apontam que a longevidade crescente torna obsoleto o modelo de repartição simples, no qual os trabalhadores ativos financiam os benefícios dos inativos. A queda da fecundidade e o aumento da expectativa de vida exigem, assim, a revisão dos parâmetros do sistema, com vistas à sua viabilidade futura.
Contudo, diversos críticos têm chamado a atenção para os efeitos sociais das novas regras. Argumenta-se que a reforma impôs obstáculos excessivos ao acesso aos benefícios, especialmente para os trabalhadores informais, de baixa renda ou submetidos a condições laborais desgastantes. Conforme analisa Vicente (2021), embora as mudanças façam sentido sob a lógica fiscal, elas se mostram socialmente excludentes, por desconsiderarem as profundas desigualdades regionais, de gênero e de classe que ainda marcam o mercado de trabalho brasileiro. Havendo, desse modo, o risco de que a busca pelo equilíbrio orçamentário venha acompanhada do enfraquecimento das garantias sociais constitucionalmente asseguradas.
No tocante aos servidores públicos, foram instituídas regras de transição mais rígidas, que impõem maior tempo de contribuição e idade mínima. Além disso, as alíquotas progressivas aumentaram a carga contributiva dos que recebem maiores salários. Guimarães (2024) ressalta que a lógica da progressividade contribui para tornar o sistema mais justo sob o ponto de vista contributivo, ainda que não solucione integralmente os desequilíbrios do regime próprio, especialmente em razão da concentração de rendas elevadas em determinadas carreiras do funcionalismo público.
Paralelamente às mudanças estruturais promovidas pela reforma previdenciária de 2019, observou-se também um impulso significativo na expansão da previdência complementar, especialmente no setor público. A adesão a esses regimes passou a ser estimulada como uma alternativa para reduzir a dependência do sistema estatal, indicando uma transição para o modelo de capitalização individual como possível caminho para a sustentabilidade futura da previdência.
Por seu turno, trabalhadores com históricos marcados pela informalidade ou por longos períodos de desemprego enfrentam obstáculos mais severos para atender aos novos critérios exigidos para a concessão de benefícios. Nesse contexto, Lima (2025) destaca que o aumento do tempo de contribuição e da idade mínima, na prática, exclui grande parte da população economicamente ativa, especialmente nas regiões mais carentes do país.
Sob a ótica fiscal, a reforma foi amplamente reconhecida como uma medida necessária para garantir a estabilidade das contas públicas. Contudo, seus desdobramentos sociais levantam preocupações relevantes quanto ao agravamento das desigualdades já existentes. Como observa Vicente (2021), embora a Emenda Constitucional nº 103 tenha promovido certa estabilidade econômica no curto prazo, os impactos sociais decorrentes dessas mudanças ainda demandam uma análise mais profunda e criteriosa.
Para ilustrar com maior clareza as principais mudanças introduzidas pela Emenda Constitucional nº 103/2019, apresenta-se, a seguir, uma tabela comparativa entre as regras anteriores e as aprovadas pela reforma. Sua visualização permite compreender as alterações estruturais nos critérios de concessão de benefícios, como a fixação da idade mínima para aposentadoria, o novo tempo mínimo de contribuição, as modificações na pensão por morte e o aumento das alíquotas para servidores públicos. Essa comparação facilita a análise do impacto direto da reforma tanto sobre os segurados do Regime Geral - RGPS quanto sobre os Regimes Próprios de Previdência Social - RPPS, contribuindo para uma melhor compreensão dos desafios e das implicações sociais decorrentes dessas transformações normativas.
Tabela I - Principais alterações introduzidas pela Emenda Constitucional n.º 103/2019
ASPECTO | ANTES DA EC 103/2019 | DEPOIS DA EC 103/2019 | REGIME PREVIDENCIÁRIO AFETADO |
Modelo previdenciário | Solidariedade | Capitalização individual | RPPS |
Idade mínima para aposentadoria por tempo de contribuição | Não havia idade mínima (exceto professores e servidores públicos federais) | Idade mínima: 65 anos (homens) e 62 anos (mulheres) | RGPS (INSS) e RPPS (servidores federais) |
Tempo mínimo de contribuição (aposentadoria por idade) | 15 anos (homens e mulheres) | 15 anos (mulheres) e 20 anos (homens) | RGPS |
Forma de cálculo da aposentadoria | Média dos 80% maiores salários de contribuição + fator previdenciário (se aplicável) | Média de 100% dos salários de contribuição desde julho de 1994. Percentual inicial de 60% + 2% por ano adicional (além de 20 anos para homens e 15 para mulheres) | RGPS e RPPS |
Reajuste dos benefícios | Conforme índice da inflação | Mantido conforme inflação (sem alterações) | RGPS e RPPS |
Aposentadoria por tempo de contribuição | Permitida com 30 anos (mulher) e 35 anos (homem) sem idade mínima | Extinta. Agora exige idade mínima obrigatória | RGPS |
Regras para servidores públicos federais | Aposentadoria com integralidade e paridade para quem ingressou até 2003 | Integralidade e paridade apenas se cumpridos 65 anos (homens) ou 62 (mulheres), com 20 anos de serviço público, 5 no cargo e 62/65 anos de idade | RPPS |
Cálculo da pensão por morte | 100% do valor da aposentadoria ou do benefício a que teria direito o segurado | 50% do valor + 10% por dependente, até o limite de 100% | RGPS e RPPS |
Alíquotas de contribuição dos servidores públicos federais | 11% (fixa) | Alíquotas progressivas: de 7,5% a 22% conforme a faixa salarial | RPPS |
Regras de transição | Não se aplicava, pois não havia reforma | Foram criadas diversas regras de transição (pontuação, idade mínima, pedágio de 50% e 100%) | RGPS e RPPS |
Aposentadoria especial (atividades de risco ou insalubres) | Exigia tempo mínimo na atividade perigosa ou insalubre | Passou a exigir idade mínima além do tempo de exposição ao risco | RGPS e RPPS |
Fonte: Autor
A Tabela acima mostra, sinteticamente, as principais mudanças introduzidas pela EC nº 103/2019 nos regimes de previdência social, destacando alterações como a fixação da idade mínima para aposentadoria de 65 anos para homens e 62 para mulheres e a extinção da aposentadoria por tempo de contribuição sem requisito etário.
No caso dos servidores públicos, a reforma instituiu alíquotas de contribuição progressivas, podendo atingir até 22%, e tornou obrigatória a adesão à previdência complementar para os novos ingressantes. A pensão por morte, antes integral, passou a ser calculada com base em 50% do valor do benefício do falecido, acrescida de 10% por dependente, o que reduziu substancialmente a proteção às famílias em situação de luto.
Como arremate, pode-se afirmar que apesar da busca para solucionar o grave problema do déficit da previdência, do ponto de vista social, a EC nº 103 trouxe consigo o risco de aprofundar desigualdades sociais, especialmente quando alterou direitos dos trabalhadores de baixa renda e grupos vulneráveis. É essencial, portanto, que qualquer alteração preserve os princípios de justiça social, solidariedade e proteção à dignidade da pessoa humana que fundamentam o sistema constitucional brasileiro.
Ressalte-se, por fim, que a emenda constitucional, por si só, não é suficiente para combater o déficit previdenciário se o poder público não combater a corrupção, malversação do dinheiro público e a sonegação, além de atuar ativamente para melhoria do desempenho da economia de modo a ampliar a base contributiva.
6. RESULTADOS DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 103/2019
Conforme o exposto neste texto e baseando-se no Estudo Técnico realizado por Cambraia; Gregianin; Volpe (2020) podemos afirmar que o regime geral de previdência social e os regimes próprios dos servidores civis e militares da União compõem o principal ramo do sistema previdenciário brasileiro, tendo o poder público federal a responsabilidade pela sua gestão.
Ainda de acordo com o mencionado Estudo Técnico, o modelo de financiamento é de repartição simples, o que significa que as contribuições sociais dos trabalhadores e dos seus empregadores incidentes sobre a folha de pagamento deveriam suportar os pagamentos efetuados aos beneficiários atuais. Contudo, como já analisado, as receitas têm se mostrado insuficientes para atender as despesas com o pagamento de aposentadoria e benefícios. Essa diferença entre o que é arrecadado e os pagamentos, corresponde ao déficit previdenciário e, historicamente, vem sendo coberta com recursos públicos provenientes de outras fontes de receita do orçamento da União.
Isso tem sido uma preocupação constante na condução da política fiscal pelo governo federal, pois afeta de forma significativa o equilíbrio das contas públicas. Essa situação fica evidente através das inúmeras reformas dos regimes previdenciários já realizados ao longo do tempo, motivadas, especialmente, pelo crescimento do déficit, dentre as quais se insere a EC nº 103, cujos efeitos práticos já podem ser observados no sistema previdenciário.
Do ponto de vista fiscal, talvez o principal resultado tenha sido a desaceleração do crescimento dos gastos com benefícios previdenciários. Dentre as causas podemos citar:
1. à imposição de uma idade mínima para aposentadoria de 65 anos para homens e 62 para mulheres;
2. modificação das regras de cálculo dos benefícios;
3. aumento do tempo médio de contribuição
Essas regras contribuíram para adiar a entrada de novos aposentados no sistema e reduzir o valor médio das aposentadorias a nova fórmula, como mencionado anteriormente, que utiliza a média de 100% dos salários de contribuição com alíquota inicial de 60%, resultou em benefícios mais modestos para trabalhadores com vínculos instáveis.
Assim, os trabalhadores precisam contribuir por mais tempo para se aposentar e mesmo aposentados continuam a contribuir para o sistema, o que tem resultado em um aumento gradual do tempo médio de contribuição observado no Regime Geral da Previdência Social – RGPS.
Ressalte-se ainda, que segundo a Agência Gov (2025), em comparação com 2023, o ano de 2024 registrou uma queda da diferença entre arrecadação e valores pagos pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Foram R$ 30,3 bilhões em 2024, contra 31,5 bilhões no ano anterior, uma queda estimada em 3,8%. Os dados são do Tesouro Nacional, divulgados pelo Relatório Resumido da Execução Orçamentária da União (RREO), no final de janeiro/2025.
Ainda segundo a Agência Gov (2025), redução do trabalho informal aumentou a base de contribuintes, em 2024, o número de trabalhadores com carteira assinada foi de 103,3 milhões. A média de desemprego, de 6,6%, foi a menor já registrada no País. Por outro lado, o regime de previdência própria dos servidores públicos registrou aumento do déficit. O dos militares ficou em 2,3%, já o dos servidores públicos civis foi de 1,9%.
Em contraposição à desaceleração do déficit previdenciário, os gastos com benefícios assistenciais, como o Benefício de Prestação Continuada - BPC, tem aumentado significativamente nos últimos anos, pressionando as contas públicas, de acordo com matéria veiculada no site de notícias G1 (2025), os gastos do governo federal com pagamento do BPC - Benefício de Prestação Continuada aumentaram mais de R$ 50 bilhões nos últimos cinco anos. Mais de 6 milhões de pessoas recebem hoje o BPC, o Benefício de Prestação Continuada. Em junho de 2022, eram menos de 5 milhões - uma curva que vem crescendo.
A estimativa de gastos para 2025 é de cerca de R$ 113 bilhões. Em 2022, foram R$ 74 bilhões. Segundo o governo, a alta no número de concessões do BPC, com o consequente aumento das despesas para pagá-lo, acontece principalmente por causa do crescimento das decisões da Justiça em favor das pessoas com deficiência, acrescido, também, pelo aumento do crescimento da população idosa e de pessoas com deficiência em situação de vulnerabilidade, além do aprimoramento dos processos de concessão do benefício.
Portanto, o aumento contínuo dos gastos assistenciais como o Benefício de Prestação Continuada - BPC exerce pressão adicional sobre as contas públicas brasileiras, contribuindo para o desafio fiscal enfrentado pelo governo na busca pela sustentabilidade da seguridade social.
7. IMPACTOS SOBRE GRUPOS VULNERÁVEIS
A Emenda Constitucional n.º 103/2019 preservou, em parte, os direitos dos trabalhadores rurais e dos beneficiários do Benefício de Prestação Continuada - BPC, mantendo regras específicas para esses segmentos. Ainda assim, os efeitos sobre os grupos em condições de vulnerabilidade, como trabalhadores informais, rurais, pessoas com deficiência, mulheres e beneficiários de assistência social, têm sido objeto de críticas por diversos estudiosos e entidades da área social. Inicialmente, propostas mais rígidas chegaram a ser consideradas, mas foram abandonadas devido à forte mobilização social e à pressão política exercida por diversos setores (Lobato; Costa; Rizzoto, 2019).
Em contrapartida, a reforma causou impactos mais severos sobre os grupos mais vulneráveis da população urbana, notadamente os trabalhadores de baixa renda e aqueles submetidos a condições laborais exaustivas. O aumento da idade mínima e das exigências de tempo de contribuição dificultou o acesso à aposentadoria, especialmente entre aqueles que ingressam precocemente no mercado informal, com trajetórias laborais descontínuas. Além disso, as novas alíquotas de contribuição ampliaram a carga tributária sobre os trabalhadores, sem assegurar melhorias proporcionais nos benefícios (Santos; Ribeiro, 2019).
Em outras palavras a elevação da idade mínima para aposentadoria e a mudança no cálculo dos benefícios, que passou a considerar a média de 100% dos salários de contribuição, sem descartar os 20% menores, como era anteriormente, reduziu o valor médio das aposentadorias e dificultou o acesso de trabalhadores com vínculos instáveis e de baixa remuneração, um perfil comum entre os pobres e informais.
Segundo Lavinas (2015), ao endurecer os critérios para a obtenção de benefícios, a reforma aprofundou desigualdades sociais preexistentes, penalizando especialmente os que se encontram em condições precárias de trabalho e de renda. Isso é especialmente preocupante no Brasil, onde mais de 40% da força de trabalho atua na informalidade.
A Emenda Constitucional nº 103/2019 afetou homens e mulheres de maneira distinta, mas os impactos sobre as mulheres foram particularmente significativos e, em muitos casos, desproporcionais, devido às desigualdades estruturais de gênero no mercado de trabalho e na divisão das responsabilidades familiares.
Isso ocorre porque a trajetória profissional feminina é marcada por maiores interrupções no vínculo empregatício, em razão de licenças-maternidade, afastamentos para cuidar de filhos ou de familiares doentes, além da dificuldade de manter-se continuamente no mercado de trabalho formal. Tais condições são reflexo da chamada dupla jornada de trabalho, conceito que se refere ao acúmulo das atividades profissionais com as tarefas domésticas e de cuidado, que ainda hoje recaem majoritariamente sobre as mulheres.
Nesse sentido, podemos afirmar que a EC nº 103/2019 falhou ao não levar em consideração essas desigualdades históricas de gênero na estrutura previdenciária. Ao aplicar regras uniformes para homens e mulheres, como o novo cálculo dos benefícios, o aumento no tempo mínimo de contribuição e a exigência de uma média salarial mais longa, a reforma desconsiderou o princípio da equidade, que é um dos pilares constitucionais da seguridade social (CF/88, art. 194, VII).
Com relação aos trabalhadores rurais, embora a aposentadoria rural tenha sido preservada em vários aspectos formais, como a manutenção da idade mínima em 55 anos para mulheres e 60 anos para homens, houve endurecimento nos critérios de comprovação da atividade rural, o que tem repercussões significativas sobre populações historicamente vulneráveis.
Esse endurecimento ocorreu principalmente na exigência de prova documental da atividade rural, como contratos de arrendamento, notas fiscais de venda da produção, registros de sindicato ou declarações de associações. Para trabalhadores rurais informais, sem registros oficiais regulares, essa exigência torna-se um obstáculo quase intransponível. Isso atinge especialmente agricultores familiares, extrativistas, quilombolas, povos indígenas e ribeirinhos, cuja inserção no mercado de trabalho ocorre frequentemente fora da lógica formal, com base em relações comunitárias, familiares e de subsistência.
Dessa maneira, podemos destacar que ao exigir comprovação mais rígida e vincular o acesso ao benefício a contribuições previdenciárias efetivas, a reforma prejudicou o caráter protetivo e inclusivo da previdência rural, que, por natureza, foi concebida para atender populações que vivem em contextos de maior fragilidade econômica e social. Essa mudança representa, portanto, um retrocesso na lógica de inclusão social presente nas políticas públicas de seguridade social instituídas pela Constituição de 1988.
Portanto, embora não tenha havido alteração direta nos requisitos legais de idade e tempo de carência para aposentadoria rural, a restrição dos meios de prova e o reforço à contribuição formal criaram barreiras práticas que têm dificultado o acesso dos mais pobres aos direitos previdenciários, contrariando os princípios constitucionais da universalidade da cobertura e da equidade na seguridade social.
O Benefício de Prestação Continuada - BPC previsto na Lei Orgânica da Assistência Social (Lei nº 8.742/1993) e já mencionado anteriormente, é um benefício assistencial pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS no valor de um salário mínimo mensal a pessoas idosas (com 65 anos ou mais) e pessoas com deficiência de qualquer idade, desde que comprovem baixa renda familiar, atualmente limitada a 1/4 do salário mínimo por pessoa da família, nos termos da legislação vigente.
O BPC tem papel crucial na redução da pobreza extrema entre idosos sem histórico contributivo e pessoas com deficiência em situação de vulnerabilidade, funcionando como um dos poucos instrumentos de amparo do Estado a segmentos que não conseguem acessar a previdência contributiva por exclusão histórica ou estrutural do mercado formal de trabalho. Assim, qualquer ameaça ao seu valor ou aos seus critérios de elegibilidade representa um risco real de agravamento da desigualdade social no país.
No que tange à aposentadoria por incapacidade permanente (antiga aposentadoria por invalidez) e o auxílio por incapacidade temporária (antigo auxílio-doença), as alterações introduzidas pela EC 103/2019 afetaram tanto os critérios de concessão quanto a forma de cálculo dos valores desses benefícios, com repercussões diretas para os trabalhadores segurados do Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
De acordo com a nova sistemática de cálculos dos benefícios por incapacidade, o valor do benefício passou a corresponder a 60% da média de todos os salários de contribuição, com acréscimo de 2% por ano de contribuição que exceder 20 anos para homens e 15 anos para mulheres.
A reforma manteve o direito ao benefício integral (100% da média de salários) apenas para casos de incapacidade decorrente de acidente de trabalho, doença profissional ou do trabalho. No entanto, para as demais doenças e acidentes comuns, mesmo que resultem em incapacidade total, aplica-se a nova regra de cálculo reduzido, criando uma diferenciação significativa de proteção social, que não existia anteriormente.
As alterações nos benefícios por incapacidade impactam de forma mais intensa trabalhadores em ocupações insalubres, perigosas ou desgastantes, que frequentemente enfrentam doenças laborais e condições físicas debilitantes antes de atingir o tempo necessário para uma aposentadoria tradicional. Do ponto de vista social, por certo, as alterações contrariam o princípio da dignidade da pessoa humana e da proteção social ao trabalhador incapacitado, fundamentos centrais do sistema previdenciário brasileiro desde a Constituição/1988.
Assim, a EC n.º 103/2019, embora tenha sido pensada para garantir a sustentabilidade fiscal do sistema previdenciário, gerou consequências muito negativas para os grupos sociais mais frágeis. O tratamento diferenciado concedido a algumas categorias não elimina o fato de que o acesso à proteção social se tornou mais difícil para milhões de brasileiros. Diante disso, torna-se necessário refletir sobre o equilíbrio entre a estabilidade econômica e a justiça social na formulação de políticas públicas.
Para melhor compreensão dos efeitos diferenciados da Emenda Constitucional n.º 103/2019 sobre os diversos segmentos da população, elaborou-se o gráfico a seguir, que ilustra o grau de impacto da reforma previdenciária sobre grupos vulneráveis. Observa-se que, embora trabalhadores rurais e beneficiários do Benefício de Prestação Continuada - BPC tenham sido relativamente preservados das mudanças mais severas, outros segmentos, como pessoas com deficiência, trabalhadores informais e de baixa renda, enfrentam obstáculos mais significativos para o acesso à aposentadoria e demais benefícios. O gráfico evidencia a complexidade e desigualdade dos efeitos da reforma, reforçando a necessidade de políticas compensatórias e de monitoramento contínuo.
Gráfico I – Principais impactos da Reforma Previdenciária sobre grupos vulneráveis.

Fonte: Autor
Conforme ilustrado no gráfico I, os impactos da Emenda Constitucional n.º 103/2019 sobre os grupos vulneráveis não foram homogêneos. Enquanto trabalhadores rurais e beneficiários do Benefício de Prestação Continuada - BPC foram, em grande parte, poupados das mudanças mais rígidas, outros grupos, como trabalhadores informais, pessoas com deficiência e de baixa renda, enfrentaram obstáculos adicionais para alcançar os critérios exigidos pelos novos parâmetros previdenciários. O gráfico evidencia a desigualdade na distribuição dos efeitos da reforma, ressaltando a necessidade de ações complementares que garantam a proteção social desses segmentos.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Emenda Constitucional n.º 103, promulgada em 2019, introduziu no ordenamento jurídico pátrio a sétima Reforma da Previdência, novamente visando conter o crescente déficit previdenciário e assegurar a estabilidade financeira do sistema. As mudanças introduzidas alteraram substancialmente a estrutura dos Regimes de Previdência e Assistência Social, impactando diretamente a milhões de brasileiros.
Os resultados apresentados neste trabalho evidenciam que os objetivo alcançados ainda são tímidos e ocasionou a perda ou retrocessos na seara dos direitos sociais já conquistados.
Nesse sentido, pode-se afirmar que transcorridos seis anos de Reforma, o déficit previdenciário continua elevado, porém, crescendo a um ritmo menor, como demonstrado item 5, o Regime Geral de Previdência registrou em 2024 uma queda no déficit previdenciário da ordem de 3,8% quando comparado com 2023. Em contrapartida, os gastos com a previdência dos militares e servidores públicos federais, aumentaram, respectivamente, 2,3% e 1,9%.
Por seu turno, os gastos com benefícios assistenciais, como o Benefício de Prestação Continuada - BPC, registrou aumentado significativo nos últimos anos, passando de R$ 74 bilhões em 2022 para uma estimativa de R$ 113 bilhões em 2025, aumento de aproximadamente 52,70% nos últimos cinco anos.
Talvez, a longo prazo, essa situação aconteça de forma acelerada e sejam alcançados os fins pretendidos pela Reforma. Contudo, há necessidade que as diferentes esferas de governo combatam a corrupção, a má aplicação das verbas públicas e a sonegação. Além disso, cumpre aumentar a base de contribuintes, sobretudo, incorporando os trabalhadores informais e adotar políticas econômicas voltadas para a geração de emprego, em outras palavras, promover o crescimento econômico do país.
Cumpre frisar que o regime de custeio, pendente de aprovação de Lei Complementar, adotou forma de capitalização individual, em contraposição ao regime anterior na ideia de solidariedade. A partir desse regime, a capitalização transfere a responsabilidade exclusivamente ao segurado, que dependerá do saldo acumulado para garantir sua aposentadoria.
Quanto ao seu impacto social, a Reforma da Previdência de 2019, tornou mais difícil a aposentadoria, reduziu benefício e pensões, impactando de forma negativa os trabalhadores de baixa renda, trabalhadores rurais, idosos e mulheres. Em síntese, muitas das conquistas sociais obtidas com a promulgação da Constituição de 1988, forma perdidos ou dificultado seu acesso.
E este é justamente o desafio a ser superado: eliminar ou, ao menos, reduzir ao máximo possível o déficit previdenciário em contraposição à perda dos direitos conquistados. A história da seguridade no Brasil, longe de ser linear, reflete os embates entre modelos assistenciais, o papel do Estado e os direitos fundamentais do cidadão, um desafio que necessita urgentemente ser superado, sob pena de prejuízos para as gerações futuras, especialmente, em um país com grandes desigualdades sociais e onde segundo dado do IBGE (2024), em 2023 cerca de 27,40% da polução vivia abaixo da linha da pobreza.
8. REFERÊNCIAS
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AGÊNCIA SENADO. Após 100 anos, Previdência enfrenta reformas, déficit e envelhecimento da população. Senado Federal, Brasília, 25 jan. 2023. Atualizado em: 26 jan. 2023. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2023/01/25/apos-100-anos-previdencia-enfrenta-reformas-deficit-e-envelhecimento-da-populacao. Acesso em: 31 maio 2025.
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Como citar esse artigo:
TRAGODARA, Daniely Freitas; SERRA, Luan Henrique Muniz; BEZERRA, Nara Cibele Braña. A reforma da previdência de 2019: efeitos e desafios para a seguridade social brasileira. Revista QUALYACADEMICS. Editora UNISV; v.3, n.1, 2025; p. 641-675. ISSN 2965976-0 | D.O.I.: doi.org/10.59283/unisv.v3n2.023
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